O amor não sabe matemática

A idade é apenas um número. Sim? Não? Os anos são contabilizados em tempo, dias, meses e tudo o mais. A experiência não faz parte desta equação que nem esconde as várias incógnitas. O estado de espírito não é para aqui chamado. Esse é o motor que rege os que sabem como saltar montanhas e ainda escorregar em poças que a chuva deixa no chão.

Tenho reparado numas pessoas que usam o mesmo metro que eu. Da primeira vez que nos cruzámos, quase que nem reparei neles, mas houve um dia que o calor que emanavam, do mais potente, era tão forte que não podia ser de forma alguma ignorado. São dois homens bem curiosos que sabem sorrir com os olhos e ainda melhor com o corpo.

O mais novo não deve ter mais que vinte anos, por excesso, mas o ar de menino angelical dá-lhe um carisma engraçado. A conversa que lhes ouvi, eu sei que não se deve fazer isso, mas acontece a muito boa gente e aos outros também, era sobre a faculdade e o cuidado do senhor era amoroso. Dizia-lhe para conferir tudo antes de entregar e para não dar troco a quem não merece.

Posso imaginar o que quiser, mas a pasta de tamanho gigante impele-me para artes. Talvez seja arquitetura ou design, mas, a verdade, é que não sei. Tem cara de estilista, mas é outro disparate comum. Ninguém tem cara de coisa nenhuma, é tudo uma ilusão. Suponho que seja de agulha e dedal.

O homem tem alguns anos e o cabelo branco tem ondas de sabedoria. Fala de modo muito calmo, pausado e o bigode farto e sonhador, faz lembrar o Coronel Cody. Os casacos têm inúmeros bolsos e fica com ar de aventureiro. Imagino-o com uma espingarda a penetrar na floresta.

Com o passar dos dias entendi o cuidado que existe entre eles. Poder-se-ia pensar que eram pai e filho, mas isso seria um engodo. Há algo ainda mais forte que os une, um amor daquele romântico, do que faz suspirar. Um amor tão belo que não se trava em convenções nem limitações.

Os que nunca sentiram esta tão suave nuvem de conforto, o terno abraço de sentir, circulam em vias enlameadas e pouco atraentes. É um poema ver os dois e a forma de entrosamento que partilham. Seguramente que lhes acresce tempo de vida, uma qualidade que não tem preço nem seguro para avaliar.

Os amores serôdios podem ser perigosos por retirarem o filtro social, contudo são mais puros por não quererem perder nem uma simples migalha da dádiva recebida. Que belo é saber amar sem amarras nem limites.

Nada que façam pode ser criticado. No seu mundo não há juízos de valor, de quem tem inveja de sentir e abrir o coração até estar tão desnudado como a virgindade emocional. O sentir não é exclusivo, mas rasgar o peito de tanto despudor, é de somente alguns.

O cuidado que demonstram, sem qualquer tipo de toque, transborda de delicadeza e interesse puro e sentido. Quem abre a alma com tanta e tão deliberada clareza, terá de receber os mil proventos de tanto investir. Transmitem tanto doce que se arrisca a enjoar.

Quem ama cuida e não espera retorno. Quer a felicidade instantânea e simples, a que faz o espírito elevar e finalmente planar. Amar é verbo tão peculiar que não tem estereótipo que lhe possa encaixar. Suspiro de os ver e eles, que se amam de forma despudorada, nem reparam em mim, uma reles espia na casa deste tão enternecedor amor.

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