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Narciso e Goldmundo

Em frente das colunas geminadas do arco românico do mosteiro de Mariabronn erguia-se um castanheiro, nobre árvore de tronco poderoso, solitário filho do Sul, trazido outrora de Roma por um peregrino.

Com estas palavras tem início a mais bela narrativa que li de Hermann Hesse, um dos primeiros Prémios Nobel que me conquistou. Foi aos vinte anos, tempo de faculdade e de questionamentos, que me deixei levar pela relação ambígua entre os dois protagonistas que dão o título ao livro: Narciso, interno no mosteiro, era adepto da disciplina e da obediência; Goldmundo, espírito livre, é levado pelo pai para a vida religiosa. Recebido por Narciso, cedo este percebe que o lugar do rapaz com quem tanto se identifica não é ali, na clausura de Mariabronn, e incita o amigo a partir.

As descobertas da Arte, da Religião, do Amor, da Amizade ou da Família, mais não são do que o trilhar do Caminho de um jovem rumo à sua natureza. Narciso e Goldmundo é um livro maravilhoso cuja história decorre na Alemanha medieval, palco das inquietações do autor.

O nome do livro ficou-me registado na memória numa aula de Filosofia do 10º ano, a partir de uma referência feito pelo Vítor (na altura professor, hoje meu amigo). Narciso e Goldmundo, talvez por serem dois nomes demasiado estranhos, ficaram gravados na base de dados mental, sendo consultados aos vinte anos quando comprei o exemplar amarelo da editora Guimarães, emprestado para sempre (entretanto já substituído por uma edição mais moderna). Seguiram-se outros livros do autor, uns fantásticos como O Lobo das Estepes ou Demian, outros nem tanto, como Siddhartha (curioso como um livro tão pequeno pode levar ao desespero de tão entediante – ainda não havia aprendido na altura a desistir dos livros que não nos cativam).

No pequeno périplo pela net para aferir da existência do mosteiro, fiquei a saber que Mariabronn é na verdade o alter-ego do Mosteiro de Maulbronn, este real, onde Hesse foi seminarista. O mosteiro marca presença em dois outros livros do autor, Hans e O Jogo das Contas de Vidro (aqui como Waldzell).

Parecia uma despedida e era, na verdade, o antegosto de um adeus. Ali, diante do seu amigo, Goldmundo, ao contemplar aquele rosto decidido e aquele olhar dirigido para um alvo, sentiu iniludivelmente que os dois já não eram irmãos, companheiros e iguais, que os seus caminhos se tinham bifurcado. Aquele que ali estava à sua frente não era um sonhador nem esperava por apelos do destino: era um monge, comprometera-se, pertencia a uma regra firme e a um dever, era um servidor da Ordem, da Igreja, do Espírito. Goldmundo, porém, como hoje claramente reconhecera, já ali não pertencia, não tinha pátria e um mundo desconhecido esperava-o. (…) Oh, como Narciso previra isto de longa data, como tivera razão!”

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