O futebol é muito mais do que um desporto, é muito mais dos que 22 jogadores a disputarem uma bola dentro das “quatro linhas”. O futebol é tradição, é cultura e, acima de tudo, a paixão de muitos milhões. Existem no mundo cerca de 270 milhões de pessoas envolvidas activamente neste desporto, segundo o relatório da FIFA de 2006. Destes 270 milhões, 265 milhões são jogadores. Para além destes protagonistas, o futebol envolve todos aqueles que religiosamente sonham com a actuação dos jogadores: os adeptos, sendo que se estima que o futebol tenha cerca de 3.5 biliões de fãs, a nível mundial. O que faz do futebol o Desporto Rei.
A paixão destes biliões de fãs é vivida para além dos 90 minutos, é vivida constantemente. O emblema inscrito nas camisolas tem um valor religioso e ostentá-lo tem um peso maior, é transportar a esperança e a paixão. Apesar das complexas regras tácticas e dos sistemas de futebol, existe ainda, como característica definidora, a irracionalidade, que deriva da capacidade de sofrimento e orgulho dos adeptos e que é transportada para aqueles que representam a sua equipa, os jogadores. Existe, portanto, uma relação especial entre os adeptos e os jogadores. Quando um jogador assina por uma equipa, torna-se propriedade da mesma, dos seus adeptos. O jogador compromete-se a “deixar tudo em campo”, a “comer a relva” pelo emblema. É uma questão de honra. Em troca, recebe a adoração dos fiéis fãs.
Nesta relação, existem jogadores que se tornaram verdadeiras lendas vivas e outros que, de um dia para o outro, viraram verdadeiros traidores, odiados por aqueles que outrora os idolatravam. A outra face do futebol é relativa ao mercado de transferências, a época em que são feitas contratações e onde os jogadores trocam de emblemas. São exigências do mercado.
São inúmeros os jogadores que protagonizaram as maiores transferências da história do futebol. Em Portugal, existem os casos de Paulo Futre, que trocou o seu clube do coração, o Sporting Clube de Portugal, pelo emblema da Invicta e, mais tarde, pelo Sport Lisboa e Benfica. Simão Sabrosa, que depois de representar o Sporting, transferiu-se para o Barcelona, regressando a Portugal um ano depois, porque havia assinando pelo rival da 2ª Circular, onde se tornou o capitão. Uma transferência bastante polémica e mediática foi a do médio João Moutinho. Um negócio que entrou para a história do futebol português como a maior transferência interna de sempre (11 milhões de euros) e que teve contornos no mínimo caricatos. No Verão de 2010, o capitão dos leões assinou pelo Futebol Clube do Porto por 3 épocas, rescindindo, assim, um vínculo de 11 épocas. Numa conferência de imprensa, o presidente leonino de então, José Eduardo Bettencourt, inflamou as hostes leoninas, ao declarar que “tínhamos um pomar com uma maçã podre, essa maçã podre contaminaria seguramente todo o ambiente e o espírito de grupo”. Foi lançado o mote e, na recepção ao Porto em Alvalade, o agora número 8 teve de enfrentar a fúria dos adeptos, ouvir cânticos muito bem ensaiados, mas muito pouco simpáticos, e uma chuva de maçãs.
Não se pense que isto são só acontecimentos do nosso país. No Futebol internacional, existem outras transferências polémicas, como é o caso de:
Luís Figo: Barcelona – Real Madrid
Após 5 épocas como culé, a lenda do futebol português trocou a capital Catalã pela capital de Castela. O mote do Barça é “Més que un club” e representa isso mesmo, é uma questão política e é a causa Catalã. Foi isso que Figo experienciou, quando regressou a Camp Nou, em 2000, sendo apelidado de “pesetero” e recebido de forma bastante hostil, com direito a uma cabeça de porco. Ainda hoje é considerada a maior traição do futebol mundial.
Roberto Baggio: Fiorentina – Juventus
Na época de 1990/91, Il Codino Divino trocou a Fiorentina pela Juventus. Aquela que se registou como a transferência recorde da época levou os adeptos viola às ruas de Florença, provocando tumultos, tendo-se registado dezenas de feridos. Quando voltou a pisar o relvado do Artemio Franchi, foi recebido sobre um coro de assobios, jogou como só ele sabia e ganhou um penalty, que recusou a marcar, e, num momento mítico, foi substituído. Ao sair do campo, foi-lhe atirado um cachecol, que Baggio apanhou e beijou. Um momento inesquecível.
Johan Cruyff: Ajax – Feyenoord
Um dos melhores jogadores de sempre fez história no Ajax de Amesterdão e no Barcelona. Regressou à Holanda, onde jogou 2 épocas ao serviço do Ajax, e, por hesitação da direcção do clube, decidiu virar-lhe as costas e assinar pelo Feyenoord de Roterdão. Nessa mesma época, terminou a sua careira como jogador, vencendo o título de campeão holandês e a taça KNVB. Algo que jamais será esquecido pelos adeptos do Ajax.
Manuel Neuer: Schalke 04 – Bayern Munich
O jovem guarda-redes titular da baliza alemã é também o protagonista de uma transferência polémica. Conhecido adepto e jogador da equipa de Gelsenkirchen, em 2011, trocou a Die Knappen pela Die Roten de Munique. Esta troca foi marcante, porque o guarda-redes jurou que jamais trocaria o Schalke 04. Por esta traição, foi proibido de beijar o emblema do clube bávaro, algo que até hoje o jogador respeita.
Mo Johnston: Celtic – Rangers
Esta transferência é parte da história do futebol escocês. Mo Johnston foi o avançado do Celtic de Glasgow, que, depois de se transferir para o Nantes de França, onde jogou 2 épocas, regressou a casa. Um regresso bastante aplaudido pelos adeptos, após ter declarado que “nunca jogaria por nenhuma outra equipa nas Ilhas Britânicas, para além do Celtic”. Em 1990, acabou por assinar pelo Rangers de Glasgow. Isto enfureceu tanto os adeptos do Celtic, como os dos Rangers, que se recusaram a celebrar os golos marcados por Mo.
Romário: Flamengo – Fluminense – Vasco
O baixinho que espalhou magia pelos campos, conta com um histórico de traições impressionante. Começou a sua carreira no Vasco da Gama do Rio de Janeiro, onde brilhou nos palcos europeus, com as camisolas do PSV de Eindhoven e do Barça. Regressou ao Brasil, assinando pelo Flamengo, intercalou essa passagem com uma representação pelo Valência de Espanha, regressando ao Mengão. Em 2000, “retorna a casa” e joga 3 épocas pelo Vasco e, na 4ª época, assina pelo Fluminense, uma relação de 3 épocas intercalada por uma no Al-Sad do Qatar. De regresso ao Brasil, volta a assinar pelo Vascão, onde joga duas temporadas. Nas duas épocas seguintes, o génio da grande área joga nos Estados Unidos da América e na Austrália. Em 2007, volta ao Vasco e, quando todos pensavam que terminaria a carreira no seu clube do coração, Romário volta a surpreender todos ao juntar-se ao América do Rio de janeiro, o clube de coração do seu pai. Romário e as suas transferências são, portanto, a verdadeira traição estadual.
Sol Campbell: Tottenham – Arsenal
Um dos grandes defesas da premier league, Sol Campbell, um produto da formação dos Spurs, trocou White Hart Lane por Highbury, quando assinou pelo rival londrino Arsenal, em 2001. Os adeptos Spurs tentaram demover o capitão e pediram que ficasse, mas foi infrutífero, Campbell passou a ser Gunner.
Kranjar: Dínamo de Zagreb – Hadjuk Split
Niko Kranjar um dotado médio croata, foi o mais jovem capitão do Dinamo de Zagreb, clube onde o seu pai jogou, até que, em 2004, todos julgavam que o jovem embarcaria numa aventura por outro campeonato. A desilusão e a fúria instalaram-se, quando foi anunciado que o jogador tinha-se transferido para o Split, onde jogou duas épocas, vencendo o campeonato na sua primeira época. No ano em que o Dinamo de Zagreb venceu o título, os adeptos não esqueceram Kranjar e, nos festejos nas ruas de Zagreb, os cânticos dirigiram-se ao jogador que tinha ganho uns quilos extra.
As transferências de jogadores vão fazendo as delícias de milhões e alimentando as paixões dos amantes do futebol. Histórias como estas irão certamente continuar a acontecer e a marcar a história do futebol.