A narrativa do povo israelita está indelevelmente associada a perseguições, escravatura e ao holocausto, que dizimou milhões de judeus. O sofrimento e a perda são conceitos familiares demais para um povo que o mundo maltratou. Porém, a história parece estar a rescrever-se e desta vez Israel encontra-se no lado oposto: agora o discurso inflamado e racista vem da boca dos políticos israelitas que parecem ter esquecido o seu passado.
“Um cancro no nosso corpo”, “uma praga nacional”, “uma ameaça, por serem muçulmanos – a doença mais terrível que há no mundo” e “um vírus que pode explodir a qualquer momento” são algumas das declarações polémicas do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e do Ministro do Interior, Eli Yishai, ao se referiram aos cerca de 60 mil imigrantes, a maioria oriundos da África Subsariana (muitos dos quais muculmanos, facto que pode explicar esta revolta e repulsa por parte dos judeus), que fugiram dos seus países fustigados pela guerra e a miséria, e que chocaram o mundo pois revelaram a faceta mais cruel e desumana de um povo que outrora foi alvo dessa mesma desumanidade.
Se estas palavras têm sido motivo de reprovação aos olhos das organizações de defesa dos direitos humanos e da opinião pública mundial em geral, para uma parte do povo judaico este discurso é coincidente com a sua visão. Numa sondagem feita pelo Israel Democracy Institute, 53% dos israelitas, que responderam ao questionário, concordam com as afirmações proferidas pelos políticos e com as medidas anunciadas pelo executivo. Desde Junho de 2012, a lei que já previa a prisão, durante três anos, dos palestinianos que tentassem entrar no país foi estendida a qualquer pessoa que entre de forma ilegal no país e entre cinco a 15 anos a quem ajudar um imigrante a entrar no território nacional.
Conscientes deste ódio crescente e do discurso xenófobo dos políticos israelitas, várias organizações não-governamentais têm alertado para o perigo destas declarações que incitam à violência e estimulam os actos racistas. Só em 2012 foram registados vários ataques a imigrantes por parte de grupos xenófobos, especialmente no sul de Telavive, no bairro Shapira, local onde vivem cerca de 20 mil estrangeiros.
Assim, “a doença mais terrível que há no mundo”, apontada pelos políticos de Israel, não é o islamismo, mas sim a discriminação, o racismo, o mesmo mal que quase exterminou Israel.