*Cuidado com os spoilers*
Eu sei, eu sei! O filme já conta com uns sólidos dez anos, mas por fazer parte da lista dos meus favoritos, chegada a oportunidade, tinha de escrever sobre ele.
Quantas vezes já demos por nós a despertar de um sonho e a ter a sensação de que aquela ideia fora plantada na nossa mente, de forma a despertar sensações nunca vividas ou a aceitar conceitos anteriormente refutados? Pois bem, é essa a premissa do filme de ficção científica Inception (A Origem) de 2010, escrito, dirigido e produzido por Christopher Nolan. Tem como protagonista Leonardo DiCaprio que interpreta Dom Cobb, um ladrão especializado em extrair informações do inconsciente dos seus alvos durante o sono, mas sem que estes se apercebam que estão a dormir.
Por consequência do destino, Cobb está impedido de visitar os seus filhos até que recebe uma proposta de trabalho pouco ortodoxa, da parte de um importante empresário (Watanabe). Essa oferta permitir-lhe-ia reverter essa situação, no entanto, teria de executar um processo nunca tentado: em vez de extrair informações da mente de alguém, teria de inserir e plantar uma ideia no subconsciente do filho de um poderoso magnata prestes a morrer, Robert Fischer (Murphy). A intenção seria “dar-lhe a ideia” de dissolver o império do pai, evitando assim a liderança por parte de uma só empresa. Tanto os extratores como a vítima participariam de um sonho comum, introduzindo elementos seus nesse mundo. No fundo, o objetivo de plantar essa ideia no sono, é torná-la como uma coisa sua, e não uma influência de alguém, pois durante o sono a mente torna-se mais vulnerável, uma vez que o subconsciente, em princípio, não levanta obstáculos à extração de informações, ao contrário de uma mente acordada que gera defesas.
O plano parece absurdo e rebuscado, mas a ínfima possibilidade de voltar a ver os filhos dá a Cobb a certeza que precisava para aceitar o desafio. Para ajudá-lo no processo, contrata Ariadne (Ellen Page), arquiteta que é recrutada para projetar os cenários do sonho, aqui designados por Labirintos, e que se junta à equipa de Cobb e Arthur (Gordon-Levitt).
À medida que a ação avança, o telespectador vai também acompanhando as lutas pessoais de Cobb que poderão pôr em causa todo o sucesso do trabalho. O filme transporta-nos para uma realidade fictícia, mas ao mesmo tempo tão palpável que, só por isso, nos prende ao ecrã. Tentamos adivinhar como terminará aquela jornada, e também aí, Christopher Nolan consegue agarrar-nos, deixando no ar aquela dúvida tão necessária e importante para o desfecho de um filme que não se quer previsível, como tão bem nos habitou com filmes como Memento (2000), Insónia (2002) ou Cavaleiro das Trevas (2008), entre outros.
A linha ténue que separa o sonho da realidade, precisamente porque quando sonhamos não sabemos que o estamos a fazer, é aqui genialmente retratada. Se a perspetiva de implantar uma vontade no inconsciente de alguém já parece complicada, acompanhar o processo, ainda que de forma ficcionada através do filme, é ainda mais complexo. O desenvolvimento da ação vai-nos levando aos diferentes níveis do sonho e aos recônditos da nossa mente, confundindo, inevitavelmente, o sonho com a realidade e alinhavando a possibilidade de não conseguirmos sair de lá. E, no fundo, será que queremos?
Para quem gosta de enredos que não permitem desviar a atenção do ecrã durante 5 minutos, correndo o risco de perder o fio à meada, este é o filme adequado; para quem não é fã, poderá, porventura, achá-lo uma valente seca. Pertenço ao primeiro grupo e também ao que vibra com toda a temática relacionada com os sonhos, a interpretação dos mesmos e aquilo que a nossa mente é capaz de (nos) fazer.
Com Inception percebemos que não são necessários grandes efeitos especiais para construir um bom filme, mas sim a imaginação para explorar o cérebro humano com todos os monstros, armadilhas e memórias que por lá habitam, floreando as decisões mais importantes com o gatilho conferido pelo amor.
Quanto às prestações dos atores assumo que Leonardo DiCaprio faz parte do meu imaginário desde o Romeu & Julieta e Titanic, e como tal, confesso que não consigo isentar-me do favoritismo. Fazer o quê? A adolescência deixa marcas. Mas, ainda que não contasse com essas prestações, devo dizer que comecei, de facto, a ser fã de DiCaprio com as interpretações dele neste filme e em Shutter Island, outro dos meus Top 10, que estreou no mesmo ano que Inception e foi baseado no romance de Dennis Lahane. Talvez existam tiques nas personagens dele que estão sempre presentes, mas, não consigo imaginar outro ator para encarnar esta personagem, que não ele.
Ellen Page surpreendeu-me pela positiva mostrando mais maturidade, interpretando uma personagem mais doce e mais sentimental do que aquilo que estávamos habituados a ver, como em Juno, por exemplo. Admito que me foi um pouco difícil dissociá-la dessa personagem, mas vê-la num registo mais adulto ajudou.
E last but (not even close) the least temos a maravilhosa Marion Cotilard, atriz francesa que, no meu humilde ponto de vista, não consegue fazer nada mal. A personagem dela, ainda que não fazendo parte da ação direta do filme, leva-nos a perceber grande parte da história e a sofrer com ela, como tão bem (e habitualmente) nos faz. Se ainda não viram Ferrugem e Osso, vejam.
Para terminar, e se ainda existem dúvidas sobre a qualidade deste filme, informo que, tal cereja no topo do bolo, é o fantástico Hans Zimmer que assina a banda sonora. Motivos mais do que suficientes para uma justa avaliação de 9 em 10.
É já velhinho minha gente, mas se ainda não viram, vale a pena dedicar-lhe alguma (neste caso, muita) atenção e questionarem-se, tal como eu quando sonho com as mais estapafúrdias coisas, se andará por aí alguma empresa duvidosa a implantar-vos ideias na cabeça enquanto dormem.