GREVE, porque é GRAVE!

Não há um fim para este período de greves.

Será uma fase que o povo passa?

Será um momento de consciência grupal activa?

Será que alguém ouve?

Houve um princípio e é a partir dele que se inicia este texto.

Em momento algum da história das greves em Portugal, se assistiu a um permanente “grito das gentes” em função do aumento do custo de vida e das dificuldades. Ou, será que já existiu um número maior de grevistas em épocas passadas?

Portugueses. Cidadãos cansados, pobres e frustrados pelo permanente continuar numa estrada em nome da desumanização. Desintegração social.

Parece que se “grita” para o nada. Para um vazio de poder que, cego e surdo, apenas fala de encontro ao caos.

Se, no inicio, “a maior dificuldade que à partida enfrentámos resultou de serem muitíssimo escassos os dados (de greves) fornecidos pelas estatísticas oficiais. Aparecendo com grande atraso e muito incompletas em comparação com as de países como a Grã-Bretanha e a França, os documentos oficiais portugueses só têm uma primeira alusão a greves de 1901, sendo a primeira estatística, muito incompleta, referente a 1903. Para os serviços públicos nacionais, a greve não era ainda um facto social significativo que merecesse reflexão atenta e medidas que tocassem na organização da sociedade; era antes qualquer coisa de anómalo, estranho corpo segregado pela sociedade que a própria sociedade se encarregaria de eliminar. Assim se interpreta o que está dito no primeiro relatório: As greves singulares que tem havido no País são esboços incertos da opinião malformada dos trabalhadores, como não podia nem poderá deixar de ser enquanto a sua educação escolar e profissional permanecer no estado de atraso actual que nos causa a inferioridade nacional em concorrência com os outros povos cultos.”

– José Tengarrinha, em As greves em Portugal: uma perspectiva histórica do século XVIII a 1920 e Análise Social, vol. XVII (67-68), l981-3.°-4.°, 573-601

No fim, e este fim que actualmente decorre, qual é a dificuldade maior que enfrentamos como povo que recorre às greves para se fazer ouvir. Será que continuamos no mesmo estado de atraso que nos causa inferioridade nacional e, aqueles que, prejudicados em  manter activo um Sistema ocioso e ultrapassado, viram costas ao seu País e procuram o seu lugar junto de povos cultos e civilizados?

Ou, será que o povo está tão culto e civilizado que faz activa a sua voz e, no politicamente correcto, o poder governativo os ignora e subestima?

Como seria o mundo se estivéssemos a criar som com consciência e, a consumir som conscientemente? A planear todos os nossos ambientes de forma consciente para o som?”                                                        Julian Treasure

Parece que esta expressão é uma utopia. E, que o agora que reside na comunicação entre Povo e Governo é apenas ruído para os ouvidos deste último. Dogmatismo, ausência de escuta activa, exagero ou desculpas,… as palavras de ordem.

Aprofundar a história das greves em Portugal, no momento que todos ultrapassamos, é não só de conhecimento sobre os factos, mas também de grande responsabilidade, já que significa escolher uma posição: o de lutador ou o de vencido.

Mas, o porquê de todas estas greves?

Será que quem as faz é ouvido? Ou, até que é compreendido e aceite pelos seus pares? Trabalhadores ou não?

Relacionando a natureza das greves com a conjuntura económica, parece poder concluir-se que os períodos de depressão mais acentuada serão mais favoráveis ao desenvolvimento de um movimento predominantemente defensivo, ao passo que nos períodos de alta os trabalhadores encontrarão condições mais favoráveis para se lançar na conquista de benefícios. Mas como se relacionam então as greves ofensivas e defensivas com a subida do custo de vida? É certamente quando o salário real diminui que o trabalhador luta pela subida do salário nominal.

Esta análise social que uso como referência é, dum ponto de vista imediato, absurdamente obsoleta, tendo em conta o período temporal que incide, e a data da sua realização. Porém, em pleno século XXI, quase que acredito que as circunstâncias que levam aos trabalhadores fazer uma greve continuam a ser muito similares. Sendo os factores mais influentes de natureza face “à conjuntura económica, organização operária e situação política.”

Neste mês em que se celebra a Liberdade, elevo aqueles e aquelas que, em nome da sua, continuam na luta dos seus direitos. E, usam liberdade e livre, como palavras de ordem, para lembrar da (ir)responsabilidade dos nossos governantes neste contínuo “putrefacto” estado de coisas.

Antes estávamos sempre com medo…”

Este era o sentimento antes da revolução dos cravos, há 49 anos atrás! Por isso pergunto: que liberdade foi essa que se adquiriu?

Se aqueles que dão voz em prol dos seus direitos, o fazem para um país mais justo e equitativo e, são, ainda assim, penalizados, mal compreendidos e ignorados.

Talvez até, nem faça mais sentido ou verdade, expressá-la assim…proscrita e fora do tempo porque ninguém os escuta.

Quem sabe se aqueles que lêem estas palavras tudo fazem e dizem para que seja presente esta luta e, não só em palavra, porque…

“As nações, com a responsabilidade histórica da gente portuguesa, não podem imobilizar-se estaticamente, nem devem iludir-se infantilmente; têm que desentranhar sucessivamente da massa das suas tradições e aspirações um ideal coerente com a conjuntura histórica, que exprima e defina o seu estar mutável em concordância com o seu ser permanente.”

– Joaquim de Carvalho, Compleição do Patriotismo Português (1953)

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