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Esgotamento

Olhar o mundo que nos rodeia, hoje, é ficar com o coração pesado com tanto que vivemos de ódio, de rancor, de revolta, que levam a atitudes tão drásticas, tão violentas, tão irracionais e desumanas. O mundo que construímos está em colapso e o que estamos a viver é uma espécie de esgotamento colectivo que nos conduz, espero, a um renascer, a uma redenção. Situações como a que foi vivida em Orlando, nestes últimos dias, associada a todas as outras que nos rodeiam e que, em cada dia, nas notícias nos jornais, nas televisões, na Internet, vêm a público, revelam um estado profundo ao qual não podemos continuar indiferentes e numa passividade absoluta, achando que só acontece aos outros, que somos pacíficos e brandos e que nada disso nos irá atingir.

Pela Internet, pelas redes sociais, o radicalismo e a estupidez mascaram-se de moral, bons costumes e seriedade, onde cada um se acha juiz, onde todos parecer ser donos da razão. Vivemos numa época de hipocrisia que nos sairá cara, pois, mais cedo ou mais tarde, a semente plantada crescerá e dará frutos, os quais teremos, até ao último pedaço, de comer. Assim é lá fora, como também dentro da nossa sociedade, dentro de cada um de nós.

Não adianta de nada continuarmos a ser todos Charlie, a manter no Facebook (já sem sequer nos lembrarmos do porquê) a foto de perfil com as cores da bandeira francesa em marca de água, não adianta irmos aos concertos solidários ou ajudar na recolha de alimentos das instituições que, todos os dias, vão para as ruas auxiliar quem não tem um pedaço de pão ou um alimento quente, se dentro do nosso coração não começarmos a viver um amor profundo por quem somos e, dessa forma, compreendermos que somos todos iguais, independentemente de raça, sexo, orientação sexual, religião ou qualquer outro factor. Como as velhas beatas que batem no peito na igreja, que seguem a missa de fio a pavio, comungam e comem a hóstia, mas que depois vêm para a rua e falam da vida desta e de como a outra estava vestida, também de nada serve sermos solidários com uns, se aos outros criticamos.

O tempo de intolerância que vivemos é acompanhado por um radicalismo que, por um lado, é muito visível, mas que tem uma face muito subtil. O tempo da intolerância terá de dar lugar ao tempo da partilha e do equilíbrio, da comunicação e da cedência, do trabalho por um bem comum, acima de ideologias e de verdades. Da mesma forma, o tempo da intolerância, que nada mais é do que um tempo de medo, pois todos temos medo do que é diferente, do que foge de um determinado padrão que nos foi incutido, que nos castra e tolda o pensamento, a compreensão, a razão e o coração, precisa de dar lugar a um tempo de aceitação, de amor, de dádiva. O tempo da intolerância esgota-nos, consome-nos, cada dia mais, leva-nos a extremos de falta de humanidade, de falta de amor ao próximo, talvez aquilo que mais necessitamos neste momento.

Este esgotamento, acredito, pode levar-nos longe, no muito bom sentido, se soubermos trazer de dentro de nós a capacidade de mudar a nossa forma de estar, a nossa forma de ser, as nossas crenças, libertando-nos das coisas que realmente nos consomem. O materialismo, o poder, o fundamento radical da religião, manifestação, no fundo, também ela, de um poder, a arrogância, a falta de amor, o medo, esses, sim, são os verdadeiros cancros duma sociedade que está em plena ruptura e que, se formos sensatos, saberemos deixar quebrar, cair, para depois poder reconstruir, com novas fundações, com novas ideias, com um novo propósito. Precisamos de aprender a amarmo-nos a nós mesmos, pois apenas dessa forma seremos capazes de amar os outros devidamente, e tudo o que vemos acontecer, na verdade, para mim, é apenas mais um reflexo dessa carência, dessa falta de amor que construímos ao longo de tanto tempo de racionalidade, de culpa, de castigo. Décadas, séculos, talvez, sejam necessários para tal transformação, mas a verdade é que tudo está a começar agora, neste preciso momento, e é este o momento, até agora, mais importante para fazermos começarmos, cada um de nós, a fazer algo.

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