A sociedade está estruturada de modo parametrizado. A família ainda é a base social sendo que os filhos estão sujeitos as regras muito particulares. Não estou a falar de regras sociais e tipos de educação, que só dizem respeito a cada grupo, mas sim de normas que a própria sociedade cria para se eternizar. Longe vão os tempos dos Sofistas, professores pagos pela oligarquia, para ensinar aos seus filhos a arte da retórica. Sócrates foi o mais ousado e o mais sincero dos mestres, afirmando: ” Só sei que nada sei. ” Esses eram os tempos clássicos onde se delineava uma nova forma de estar, em termos políticos, a democracia.
Hoje vivemos numa democracia moderna, sem os constrangimentos que a inicial teve. É uma sociedade onde todos são cidadãos e a aprendizagem começa na mais tenra idade. As regras de sociabilidade são as primeiras, ao colocar uma fralda num bebé e a família será, digamos, a linha da frente desse novo ser. Contudo, a escola tem um papel determinante e decisivo. Existe uma obrigatoriedade de a frequentar, que são 12 anos, tendo como finalidade várias metas: formação de cidadãos, profissionais qualificados, pessoas que sabem lidar com conflitos e, acima de tudo, pessoas que não sejam analfabetas funcionais.
O 1º ciclo é da máxima importância, onde as primeiras letras e os primeiros números são ensinados. Há todo um esforço no sentido de entenderem o que se pretende deles, alunos pequeninos e assustados. O pré-escolar é importantíssimo pois é um modo de os treinar, gradualmente, para a responsabilidade que se avizinha. São horas que devem ser aproveitadas de modo pedagógico, mas lúdico. O 2º ciclo é um pulo na exigência e é frequente ver rostos desesperados com o que ouvem: não entendem. Há um grande desfasamento entre os 2 níveis. Não se faz a ligação que seria benéfica para todos.
O 3º ciclo é o drama. Para o concluir terão de fazer um exame. A palavra assusta desde o 7º ano e, sabendo que o mesmo se reporta aos 3 anos, os alunos vivem numa bolha de insatisfação e pavor. Nada de mais errado. Aprender é delicioso e deve ser feito com vontade. A escola fornece instrução e a educação deve vir de casa, já aqui foi dito. Os exemplos são a modelação destes jovens e se o que virem em casa é desagradável, nunca mais os conseguirão domar. Por outro lado, a exigência, que deve existir porque a vida não tem manual de instruções, é descabida. Um aluno do 9º tem de saber várias matérias, mas o professor de cada disciplina só domina a sua. É injusto.
A pressão é constante e dominadora. A competitividade deve ser positiva, estimular a aprendizagem e não discriminatória e elitista. Nem todos os alunos são moldados do mesmo barro. Existem 12 tipos diferentes de inteligência e devem ser, indubitavelmente, aproveitadas. A escolha que terá de ser feita para o Ensino Secundário é quase uma tragédia grega. Não sabem, não entendem, não querem, não de tantas maneiras. A própria instituição é antagónica. Esquece-se de informar que os cursos profissionais não dão acesso ao Ensino Superior, por exemplo. É um lapso que pode ter consequências muito graves. Este pode ser um factor de abandono escolar.
Na verdade, o que é um aluno? A escola não é uma fábrica que produz peças iguais. Que expectativas cria em relação ao seu futuro e ao que se avizinha? Estão descontentes, porque são obrigados a frequentá-la. Se o aluno só vir um livro, pela primeira vez, quando for para a escola, então esse livro representa um instrumento de trabalho. Se já estiver habituado, será mais um momento de lazer e de imaginação. Qual a função do livro? Estimular a criatividade, levar a viajar por mundos diferentes, ter saudades de um local onde nunca se foi. E é tão fácil participar nesta aprendizagem! Não são as bolas nem as bonecas que ensinam, são os livros. Não é a diferença de género que fomenta, é a igualdade. Oferecem livros, leiam livros, sejam personagens activas dos livros.
Estarão os professores preparados para a tarefa? Haverá motivação? Ensinar é um sacerdócio, necessita de dedicação e esforço. Se não se gosta do que se faz isso é, claramente, transmitido a quem devia estar a aprender. É irónico, porque passou a mensagem, mas a errada. Não se pretende pessoas descontentes, mas sim motivadas e animadas de gosto e paixão. O inverso é que se pretende, o gosto, a forma de envolver o aluno no conhecimento, o entender do que se diz. O conhecimento é uma arca que não tem fundo. De cada vez que a abrimos para ir buscar algo, reparamos que temos mais espaço vazio e deve ser preenchido. Saber é muito mais gratificante do que ser ignorante.
Se a escola insistir na ideia de “cubículos” disciplinares, se não se servir da multi e da interdisciplinariedade, estamos muito mal. A ciência não existe sozinha e a filosofia é a base de tudo. Foi dela que se tornaram independentes os diferentes tipos de conhecimento, é a ela que tudo reporta. Será assim tão difícil ver por este prisma? Vejamos um exemplo prático: ao estudar Os Lusíadas, na disciplina de Português, o mesmo deve ser situado no respectivo contexto histórico. Infelizmente nesse ano lectivo o programa de História só contempla o século XX. Um autêntico disparate. Não existe trabalho de equipa entre os diferentes saberes. Erro crasso!
O Ensino Secundário torna-se, por fim, tão técnico que os alunos, semi-infantilizados que transitaram do 9º ano, ficam totalmente perdidos e frustrados. Não é só a linguagem que deveria ter sido usada desde o início, mas também o grau de exigência. Foram permissivos até ao fim do básico e agora não desculpam nada. Não podem e não devem. No entanto, “fecharam os olhos a muitas brincadeiras” que se vão verificar fatais. Outra questão pertinente é a escolha das áreas. Grande parte escolhe a continuidade da camaradagem, ou seja, querem ficar com os amigos. É do futuro deles que se trata de não de amizades. Fazer escolhas é complicado, mas é necessário.
Se teimarmos em prolongar a infância dos nossos alunos por tempo indeterminado, iremos encontrar, num curto espaço de tempo, uma sociedade de filhos adultos a viverem com os pais e completamente incapazes de serem autónomos. A escola tem vários patamares que permitem e favorecem o crescimento. Por favor usem-na correctamente. São os filhos de alguém, os homens do futuro, aqueles que nos irão governar e gerar riqueza no nosso país. O desenvolvimento também pode ser sustentável.
Outra circunstância importante relaciona-se com o corpo docente. Todas as disciplinas são importantes. Não existem disciplinas maiores e disciplinas menores. São um todo. Importa agora referir o papel daqueles que leccionam. Sejam humildes. A vossa disciplina não é a mais importante. Isso é desrespeitar os colegas e menosprezar os alunos. Não podemos querer encontrar outro Leonardo da Vinci, mas todas as profissões são honradas e úteis. Uma sociedade necessita de todo o tipo de pessoas para funcionar em pleno. Entendido?
Os currículos estão completamente desactualizados e fora dos contextos. Não contesto, de modo algum que se devam ensinar vários saberes e conhecimentos, até o apoio. O que discordo é a maneira como está estruturado. As matemáticas não são as mais correctas. Um aluno de Humanidades acaba por ficar mais preparado para um serviço público e prático, como fazer cálculos para a Segurança Social ou Finanças do que um aluno de Economia, que aprende radianos e radicais, que nada têm a ver com a realidade. Essa seria a sua área, certo?
E agora vem a pergunta crucial e definitiva: e o aluno como fica no meio de tudo isto? É a cobaia, o peão do jogo do empurra de um lado para o outro e fica esquecido enquanto pessoa. São os resultados que interessam. Que resultados? O que é preciso é aprender, saber e fazer. A teoria é importante, mas tem de ser aliada à prática. O que queremos? Autómatos ou pessoas competentes? A polémica devia suscitar uma luz, uma solução, mas acaba por resultar num diálogo de surdos, combatido por um exército de cegos. Infelizmente.