Sinto falta dele, dizia a mensagem.
Às três da manhã, o relógio no silêncio era o palpitar do coração. O tempo escorria pelo quarto todo. Uma nuvem entrava pela janela e aninhava-se num canto. Ela escrevia mensagens no telemóvel
Sinto a tua falta
que depois apagava, ou
Queres beber café?
que enviava e de que se arrependia, incerta da melhor forma para coser o coração. Que coração, o dela ou o dele? Quantas vezes se tinham partido e colado um ao outro? Onde estariam mais crus, na superfície ou no tutano?
Quatro da manhã. Recebia mensagens carregadas de álcool e de desespero
Mataste o que nunca chegou a ser.
As tristezas manchavam almofadas, as lembranças tocavam na pele e afinal o amor quando acabava não ia para lado nenhum. Era para sempre uma nuvem aninhada num canto de nós.
Sentia raiva: talvez precisasse de se embriagar de paixão ou de álcool, de levar alguém pela mão e trancar a porta atrás de si, de se permitir tudo numa cama desconhecida e só abrir os olhos na timidez da aurora azul, violeta, laranja. Ou talvez não, talvez só precisasse de se abraçar e de se saber capaz.
Cinco da manhã. Empurrava a nostalgia nos baloiços da adolescência, brincando com os “e se”, enrolando na mente imaginações e mundos paralelos com amantes proibidos. Voltava a ser adolescente. A sombra da gata no escuro: em que metafísicas pensam os animais?
Seis da manhã: a escuridão crescia e tornava-se labiríntica, era tragada pela urgência.
Às oito da manhã acordava com respostas cheias de amnésia e de esperança
Sim, podemos beber café. Hoje?
Fechava os olhos, engolia a saliva grossa. Talvez estivesse cansada de não sentir nada. Ou de sentir tudo. De dar voltas: na cama, ao corpo, à cabeça.
Sinto falta dele, dizia a mensagem. Não sei o que fazer.
Mas sabia, sim. Sabia qual era a única coisa que queria fazer, a única coisa que havia a fazer. E sabia bem tudo o que isso significava.