Ontem foi Dia Mundial da Poesia… o meu país é um país de poetas, de bons poetas, de grandes poetas, de desmesuradamente brilhantes poetas, que não caberiam aqui, de muitos já olvidados, de outros sempre recordados, e é com um incessante prazer o sentimento que me ocupa desde sempre, amar a poesia, como se dela fosse filha, que resolvi comemorar convosco com um poema meu, de data já esquecida no baú bafiento das memórias perdidas.
Chove na rua da minha cidade
não flores, nem estrelas
porque já não se dão.
Os homens toscos da minha terra
têm vergonha da claridade
de mostrar o que sentem
Chove na rua da minha cidade
como se chovesse do espaço, a terra,
no cultivo de amores-perfeitos
na cidade cinzenta de mar maior
Chove na rua da minha cidade
apaga o burburinho das almas
ficam os pingos a bater lá fora
em caravelas de música mareando
Chove na rua da minha cidade
pedrinhas de gelo doutra vida
Quimeras da Primavera
mágoa de não saber do Sol
Andará perdido, cansado
pelos trilhos enviusados
das ruas da sua cidade
noutro astro talvez.
Chove na rua da minha cidade
e não é mais a água
pura de outros tempos
precipita-se enquanto corrói ainda
Chove na rua da minha cidade
e eu, tão somente talhada
ditam-me as palavras
do infinito desdém
tal como as chovem
percorrendo-me
o corpo enxuto
do frio hirto deste Inverno.
Chove na rua da minha cidade
todos saberão dizer de onde vêm as gotas
Correm como o sangue
Que se me esvai nas veias
Sabes dizer-me qual a terra frutífera
para onde poderei partir?
Que chova nas ruas da minha cidade
onde os homens serão homens
e as mulheres, femininas
se poderão amar sem medo
sem mentira, sem desejos vãos
como a face de quem dorme
parar de corroer serenamente
a poesia do amor.