E no fim o céu em chamas. Visão tão comum no ocaso tranquilo de cada um dos fins de tarde que aprendeu a viveu. Era no entanto no fim daquele dia de verão que sentia o sol a beijar suavemente a linha que o separava do mundo que não existia. Aquele singular dia de verão que o reservara para si como único. Único todos os anos, todos o Verões, todas as idades que lhe enrugavam a pele desenvergonhada do corpo só.
Assistia tranquilo ao desenrolar das aventuras do verão. Todos os dia salgava o corpo com a água fresca do imenso oceano, mundo de possibilidades. Em cada dia testemunhava o desenlace de dramáticos eventos mundanos nas pessoas que o rodeavam. Dramas de beijos distorcidos, vozes exasperadas, ciúmes apaixonados. Enquanto esperava. Rodeava-se de conversas anónimas, vozes surpreendentes que se aninhavam no sopé do limite da sua atenção. Vozes graves, agudas, sorridentes e melódicas, cantigas de amizade e o brilho resplandecente dos sorrisos que as acompanhavam. Enquanto esperava. Dormitava no leito dourado de fina areia quente sentido o gretar pacífico da pele a respirar o calor. Silenciava-se na esplanada de um bar defronte da imensidão azul que o acalmava enquanto esperava. E cada momento de espera era uma aula do quotidiano em que nada tinha a aprender nem nada havia que ser ensinado. Cada momento do verão vivia-o em plenitude enquanto esperava.
A espera não tinha qualquer ciência, não lhe apresentava qualquer intenção de ansiedade. Apenas espera que o dia certo chegasse e enquanto tal vivia . Mas vivia sem nunca se acercar do supremo que é suposto ser a nossa vida em qualquer momento. Havia a clara ausência de um nódulo de uma bolha de vida que na linha da sua existência viria não só dar um propósito ao seu acordar diário, como seria a própria razão e próprio despertar. Era a arma com que venceria o isolamento interior. Por isso espera calmamente com a certeza de que a espera jamais seria vã.
E então num dia igual a todos os outros do verão que era o cenário da sua história, a espera transformou-se de dias para horas. O sol subia e as horas transformavam-se em minutos. Os minutos transformavam-se segundos e fez a chamada. Silêncio, um som, novo silêncio, novo som, nova repetição, “Estou?”, “Parabéns!”.
Sim estava. Ele sabia que naquele dia ela sempre estava e celebrava-o com ele. E mesmo sabendo que envelhecia mais um ano que passava longe dela alegrava-se porque era neste dia que mais se aproximava dela. Mais do que as circunstância festivas, eram as palavras de actualização de quem ela continuava a ser, a princesa por quem se apaixonara. Ao longe sentia perto nos longos minutos que em que se gladiavam com palavras e sorrisos sentidos ainda que invisíveis entre si. Passavam dez, quinze, vinte minutos e não se cansavam. Ao fundo o sol mergulha com graciosidade e graciosa a era a sua voz. Uma voz que o aquecia e iluminava o vazio interior. Aquecia com o calor da paixão alimentada pelo céu laranja. O fogo do pôr do sol inevitável a avisar o fim daquele dia. Inevitável como era o fia daquela conversa, o fim de a ouvir, de a sentir próxima ao longe. O adeus, as promessas que nunca aconteciam e obrigavam a nova espera, o silêncio retomado. O sol desaparecido. O fim do dia.
E no fim todo ele ardia em paixão e o céu em chamas.