
Na verdade, foram duas (ou três, ou até quatro, conforme a lente com que filtre o passado) as “Aventuras na Lousã” da minha vida até hoje.
O lugar tornou-se especial pelo impacto da primeira visita: em 2005 estagiava na Secundária Luísa de Gusmão, os meus pais estavam a separar-se e eu queria aproveitar a actividade de três dias, promovida anualmente pelo núcleo de Educação Física, para espairecer: ficámos no campo da ACM – Associação Cristã da Mocidade – em Foz de Arouce, e foi um fartote de caminhadas, rapel, orientação nocturna, convívio, ao mesmo tempo que nas casas – um adulto para seis jovens – tentava arrefecer adolescentes com as hormonas a saltar no trampolim da puberdade, que trocavam de beliche como quem trocava a garrafa de cerveja numa noite de copos.

As aldeias de xisto, a mesa corrida onde fazíamos as refeições, o rapel suspenso ou australiano a desafiar a minha coragem e o caminho da levada sobre a geada das oito da manhã (era Fevereiro) a pôr à prova a minha vertigem (e o sentido de responsabilidade por termos quase quarenta miúdos a nosso cargo), a Albertina (estagiária de História) a dizer aos miúdos do seu grupo que podiam fazer o que quisessem à noite desde que não a acordassem, e o Pedro (estagiário de História, irmão dos Hell’s Angels e…) a mandar um dos putos para a “cona da tia dele” depois de ter sofrido uma canelada no jogo da bola que serviu para “amigar” à chegada.
A Amélia, orientadora de Inglês, não pôde ir, mas foi no ano seguinte, quando eu repeti já depois de ter deixado a escola e o ensino. E como foi bom ir sem a responsabilidade de evitar que os putos se encavalitassem como se não houvesse amanhã durante as noites frias da serra. Mas a verdade é que para a Amélia, das poucas amigas que ficou desse ano, não houve muitos mais amanhãs e dou graças por ter ido nessa segunda Aventura, partilhando com ela esses dias. Isso e perdermo-nos na orientação nocturna, indo parar a Casal do Ermio (pela reacção do Luís Almeida, de Educação Física, deveria ficar para lá de uma eternidade do lugar onde deveríamos terminar).
O mesmo lugar em 2005 e em 2022:
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Em Janeiro de 2022 a Sofia e eu comemorámos dois anos de namoro na Quinta das Lágrimas. Resolvemos regressar pela Lousã e o passadiço (inexistente em 2005) que percorremos até ao castelo, levou-nos a propor uma vinda com amigos. A praia fluvial, a musealização da torre, a oficialização dos percursos pedestres… quanto aquela região (e o país) mudou em 17 anos! Na altura, as aldeias de xisto estavam a ser recuperadas (o Talasnal pelo menos, onde passámos num dos passeios) e o castelo pouco mais era do que uma ruína sublinhada por um regato.

E em Abril regressámos às Montanhas de Amor, Talasnal, para um fim-de-semana prolongado com duas caminhadas, jogos à lareira nas noites frias e o convívio construído pela Sofia, a São, a Joana, o Ricardo, o João e por mim.
A serra da Lousã será sempre especial pelo modo como me acolheu da primeira vez, pelas aventuras que lá vivi e pelo convívio com a Amélia, amante da Irlanda e de cinema, da Juliet Marillier e de David Lodge, e da vida. As duas aventuras de 2022 souberam-me assim a reconciliação, apesar de a serra da Lousã nunca ter sido má para mim. Mas tal como os amigos não devem servir só para nos apoiar nos momentos difíceis, também os lugares merecem que lhes concedamos um espaço de alegria, descontração e fantasia. Estas duas últimas aventuras na Lousã trouxeram-me isso. Na melhor companhia.