Às vezes sou Clarisse

Às vezes sou Clarisse (Lispector), entre papéis do que escrevo, ranhos e fraldas. Os dois mundos: o da escrita e o da maternidade enredam-se (numa tapeçaria de Penélope) e por vezes é difícil distinguir uns dos outros. Como sou, sobretudo, contista e mãe, foi natural que me surgissem os contos infantis, desta feita à semelhança do que aconteceu com outra mãe escritora – Sophia de Mello Breyner Andresen.

O sonho talvez fosse alcançar a genialidade destas, contudo, o meu mundo não se resume só à escrita e à maternidade. Como o de ninguém. Somos uma infinidade de máscaras na nossa vida: sou também a filha, a esposa, a professora, acrescentando ainda a influencer e marketeer, estas duas últimas que se agregam à escritora, inevitável para uma escritora obscura dos dias de hoje, mas funções que não desejo, não tenho apetência, nem paciência.

Eu sou só um exemplo da complexidade que o nosso mundo tomou: deixando-nos presos numa escolha que sufoca. Sufoco que terá tirado a vida a Sylvia Plath, outra mãe poeta.

Não é a maternidade que me define enquanto pessoa – eu já estava bem resolvida antes dos filhos. Nem a profissão, apesar da inevitável influência da geração à minha frente, que se definia pelos seus estudos e profissão. Eu defino-me pelo meu projeto de vida – a escrita – mesmo que eu seja uma má escritora. Parece um equívoco, mas eu diria antes que é uma crença – de que este é o meu propósito de vida – ou então uma mania ou obsessão da qual sou incapaz de desistir após quase trinta anos de investimento.

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