Se existem histórias de amor, das puras e duras, das verdadeiras e com provas de fogo, esta é uma delas e apenas os castos de coração terão arcaboiço para ouvir esta que, além de belíssima, é muito feroz e injusta.
António e Amélia são dois jovens que se conhecem e se apaixonam. Como qualquer casal, faz planos e este par, aparentemente vulgar, resulta naquilo que se pode chamar de companheirismo. Juntam os trapinhos e fazem o que muito bem entendem.
António já era viúvo, quando conheceu Amélia e a sua filha pequena, era o seu apoio. Contudo, nestas lides do amor nada se manda e o coração é soberano e ainda bem. Amélia era o mel que faltava e a luz que incendiava o caminho. A casa ficou cheia e outra menina também iluminava.
Que felicidade a de quem tem tantas mulheres, aqueles seres que sabem como se desdobrar e chegar a qualquer lugar. O rio que é a vida seguia no seu leito calmo mesmo que os remoinhos fizessem ficar com os pés gelados. O amor tudo superada e vence.
Nestes planos feitos de desejos e esperança, estão as promessas e uma delas seria cuidar um do outro na saúde e na doença. No entanto, isso é dito por muitos e cumprido por poucos. Ninguém quer saber da dor, somente importa o amor e o estado de louca fantasia que este proporciona.
Viajam, cuidam do dia a dia e dos seus botões, das meninas que crescem e seguem os seus rumos e, sem que dessem por isso, envelhecem juntos em perfeita harmonia. Que saudável é viver assim. Só que a vida, aquilo que nos acontece a todos, pregou-lhes uma rasteira da mais safada.
Amélia fica doente e, depois da ronda de todos os exames, é-lhe diagnosticada esclerose lateral amiotrófica, a conhecida ELA, que tem a grande capacidade de roubar a qualidade de viver a todos os que dela sofrem. Uma ditadora.
Num curto espaço, somente três meses, Amélia perdeu a fala e tanto mais, mas continua a sorrir. O seu semblante não se zanga. Ela sabe que António é o seu cuidador e cumpre a promessa que lhe fez há 50 anos. Uma tão grande integridade que mostra bem a fibra do homem.
A sua vida, agora, é cuidar da Amélia e fazer com que ela saiba como é amada. Ai o amor que faz perder a cabeça e prepara testes bem difíceis. E foi nesta casa que aterrou. Sou testemunha deste enorme e extraordinário amor. A Amélia continua a querer tudo a que tem direito, ou seja, a viver todos os seus momentos.
É por isso que, quando há caminhadas organizadas ou as outras iniciativas, a Amélia nunca falha nem o seu António. São unha com carne estes dois, e ela sorri sempre, como se fosse uma menina a quem o futuro acena. Uma rapariga que tem no seu namorado o maior apoio. Confia e ama uma mão que lhe faz festas suaves.
Ninguém sabe o que irá acontecer e a Amélia, mesmo estando consciente das suas limitações, faz as suas corridas na cadeirinha e a sorrir muito como se o vento lhe afastasse os cabelos e desse mais ânimo. O certo é que mostra tanta satisfação e apreço que a todos contagia. O António só pode ser um ser humano maravilhoso.
É bem sabido que nestas aventuras de doenças, eles, os homens, têm muita dificuldade em lidar com a dor e viram as costas por ser mais fácil. O António decidiu enfrentar os bois pela frente e segue seguro. Que me perdoem os que ficam, felizes e abençoados, mas os casos raros, contam-se com números bem pequenos.
Na verdade, é muito bonito escrever desta forma leve, mas, muito sinceramente, não consigo imaginar o choro que lhe vai na alma ao ver a sua amada Amélia a definhar dia a dia, a ver desaparecer a mulher que caminhava ao seu lado cheia de vigor e segurança.
Aceita-se ou luta-se? Cada um faz o que pode com aquilo que tem ou sabe. Este homem dá tudo de si. Enquanto a sua Amélia precisar dele, o seu anjo da guarda sem as asas nem a túnica, chamado António, estará a seu lado para lhe dar a mão. O nome do santo faz-lhe jus.
Que exemplo de dedicação e abnegação dá este tão sensível homem! A raiva não se vê, mas deve ser muita e resignação é a face que mostra. Faz das tripas um grande coração e certamente com muito carinho. Cada dia é mais um novo desafio, mas ele não vacila.
Compromisso é a palavra de honra de um ser humano e a verdade é só uma, a Humanidade reside aqui, nos olhos líquidos do António que mantém a Amélia, a sua menina que sorri com os olhos, perfeita e então, nessa altura, encanta os dois corações.
Só um grande AMOR de um HOMEM como o ANTÓNIO dá este resultado tão maravilhoso. Força Amigo e um ABRAÇO.