O criador e roteirista de Mad Men, Matthew Weiner, sempre teve o dom de começar as novas temporadas desta série com episódios brilhantes e memoráveis. O último tomo no grupo de publicitários que ajudou a revolucionar o mundo das séries televisivas não é excepção, já que o primeiro episódio da última temporada de Mad Men, que foi para o ar no dia 13 de Abril, marca o início do fim de uma era. Em “Time Zones”, Weiner demonstra a sua mestria com a narrativa que criou, ao construir novas linhas narrativas em cima de antigas, algumas com twits intrigantes, outras a darem pistas sobre possíveis novas direcções. Numa temporada final em que se esperam ver as consequências dos comportamentos e das escolhas das personagens ao longo das últimas temporadas, este primeiro episódio soube colocar as peças no lugar e dando-nos pequenas indicações sobre como será o fim desta sétima temporada.
Claro que um episódio (ainda por cima o primeiro) não tem a capacidade de nos contar toda a história que irá ser desenvolvida ao longo desta temporada, mas, comparando-o com muitos da temporada transata, este consegue ser verdadeiramente espectacular. Apesar de existirem poucos episódios de estreia que consigam bater o mini-filme de duas horas “The Doorway”, repleto de agressivas alusões à morte e que deu início à sexta temporada, “Time Zones” destaca-se pelo facto de ter inúmeras cenas cheias de subtis dicas sobre como será o fim de Mad Men. Para além destes prenúncios do fim, este episódio volta a apresentar-nos a Don Draper, enquanto este apanha um avião para se ir encontrar com Megan, na Califórnia, numa cena maravilhosamente filmada, ao som ensurdecedor de “I’m a Man” dos Spencer Davis Groups. A maior parte desta cena é filmada em slow motion, introduzindo no ecrã as cores garridas da Califórnia, à medida que Don vai descendo umas escadas rolantes até desaparecer da nossa vista e voltar a reaparecer junto a Megan (e dos seus lábios cheios de desejo), que sai do seu descapotável Austin-Healey verde, completando a vivência californiana que é transmitida.
É possível argumentar que Weiner, por vezes, recorre aos episódios de estreia de cada temporada para apresentar a mudança na vida das personagens de uma forma chocante, seja isto feito através de roupas usadas, de estilos de cabelo, ou de novas oportunidades de trabalho. Contudo, o primeiro dos últimos 14 episódios é uma hora que nos faz recordar Mad Men a que fomos apresentados originalmente e exibe, à medida que o calendário vai chegando a 1970, o futuro de um conjunto de personagens que acompanhamos há tanto tempo.
A sétima temporada começa em Janeiro de 1969, quando o presidente norte-americano Richard Nixon inaugura o seu mandato, num discurso cheio de referências à sensação de rápida mudança, saindo-se da turbulência e caminhando-se em direcção a uma maior paz. A estrutura que a série tem demonstrado ter desde o seu início sempre revelou uma despreocupação no que toca a coincidir os valores que movem as personagens com as inquietações que movem a sociedade no ano em que as temporadas são desenvolvidas. Por exemplo, Mad Men iniciou a sua história em 1960, mas as atitudes societais das personagens eram mais representativas da década de 50 do que do ano em que se encontravam. Agora, no momento em que a série se prepara para a sua saída do ar, será interessante ver como é que as personagens se vão adaptar aos loucos anos 70, à medida que se tentam libertar dos estereótipos e do imaginário da década de 60.
É curioso constatar que “as pontas soltas” deixadas pelo final da sexta temporada não são resolvidas directamente nesta estreia. No último fim de temporada, Don foi despedido da Sterling Cooper and Partners, Ted Chaough decidiu ir para a Califórnia no lugar de Don, Pete, cujo casamento finalmente chegou ao fim, também decidiu mudar-se para a costa leste e Megan, seduzida pela ideia de construir uma carreira em Los Angeles, decide arriscar em mudar de vida, apesar de Don não ir com ela (a verdadeira razão para esta mudança prende-se com o facto de, perante os vários sinais que indicavam o fim do seu casamento, esta preferir optar pela liberdade que a Califórnia tinha para lhe oferecer). Don, com a sua crise existencial e os seus ciclos destrutivos, termina a sexta temporada devastado e a admitir todos os seus erros passados a um cliente (o que levou ao seu despedimento) e à sua filha Sally, que lhe deu o perdão que ele tanto procurava.
O primeiro episódio foca-se principalmente em Don e em Megan, apesar de Peggy, Pete, Roger e Joan terem alguns momentos seus. Se esta temporada final se focar nas repercussões das decisões que foram sendo tomadas no passado, é possível que a história de Peggy rivalize com a de Don para a conquista do prémio para o final mais catártico e redentor de todos os tempos. Com Don fora da SC&P, Lou Avery começou um caminho que o irá fazer entrar em confronto com Peggy, que da última vez que a vimos estava sentada na cadeira de Don, com a mesma posição que ele e no mesmo ângulo que o vimos a ser filmado na primeira temporada (a famosa imagem de marca da série). Porém, Lou, com os seus valores mais antiquados e manias controladoras, está a mantê-la longe da cadeira/posição que ela tanto quer alcançar. Será este o destino de Peggy? Lutar para chegar a uma posição tão elevada, só para ser constantemente lembrada de que o título desta série faz referência a homens (“Men”) e não a mulheres?
Em contrapartida, Pete está, inesperadamente, a adorar a sua mudança de vida, deixando para trás a sua imagem de nova-iorquino preso às convenções sociais e abraçando a energia libertadora de LA. “The city is flat and ugly and the air is brown, but I love the vibrations,” diz em determinado momento do episódio. A palete cromática que a série está a transmitir a Pete, pelo menos nesta estreia, combina na perfeição com um sorriso sempre presente no seu rosto (quando é que foi a última vez ele sorriu?) e, no momento mais hilariante de todo o episódio, com o abraço que dá a Don, quando se encontra com ele para almoçar. Será que estes pequenos vislumbres podem indicar que a trajectória que Pete irá ter neste último tomo poderá ser uma compensação por todas as dificuldades que teve de ultrapassar na sua vida?
No entanto, por mais interessantes que estas personagens sejam, Don é e sempre será o centro do universo de Mad Men e Matthew Weiner guardou um conjunto impressionante de cenas para o voltar a colocar no centro da história. Existem vários momentos ao longo do episódio que demonstram a manutenção de determinados comportamentos destrutivos e, principalmente, indicações de que a mudança não vai ser um percurso fácil para esta personagem.
Este “Time Zones” é apenas um episódio entre muitos, mas, tal como aconteceu com Breaking Bad, cada um destes novos episódios marca o início de uma contagem em direcção ao final da série e, portanto, cada um que termina carrega em si uma pequena dose de melancolia. Há, no entanto, que lembrar a boa notícia: Mad Men está de volta, vibrante como sempre.