A Mulher do Dragão Vermelho

Verão é sinónimo de férias e férias significa descanso, tempo livre e mais disponibilidade para fazer o que gostamos.

Uma das coisas que adoro, mas para a qual, normalmente, não tenho tanto tempo como queria, é ler. Com os dias maiores e a ausência de trabalho é de aproveitar para pôr a leitura em dia, em especial aqueles livros de quinhentas páginas, que nem sempre são fáceis de transportar e envolvem uma dedicação mais esmerada.

Aquele que vos trago é o último, e vigésimo-quarto, romance do jornalista e autor José Rodrigues dos Santos A Mulher do Dragão Vermelho.

Uma obra de ficção inspirada em factos verídicos que nos deixa com os olhos em bico e os cabelos em pé. «Não é um romance sobre a China e os chineses, mas sobre o Partido Comunista Chinês e a sua visão de ditadura de socialismo nacionalista – ou seja, de fascismo – que tanto sofrimento produz dentro das suas fronteiras e que começou a tentar exportar para o resto do mundo».

Os capítulos vão sendo alternados por duas histórias paralelas que, agradavelmente, se cruzam no final:

A portuguesa, Maria Flor, mulher do historiador Tomás Noronha, raptada em Amritsar, juntamente com a misteriosa fugitiva mulher do lenço negro;

A jovem da aldeia uigure, Madina, a mais nova, e mais esperta, de cinco irmãos, escolhida para ir estudar para a cidade a fim de entrar na cultura chinesa, que ganhava território a passos largos. «Dizia um velho ditado uigure que “a menina é criada para os outros”. Sim, seria criada para os outros. Só que esses “outros” seriam, pelos vistos, os chineses».

Uma história bem pensada, extensamente pesquisada, documentada e demasiadamente real.

Entristece-nos e indigna-nos saber que situações como aquelas que são relatadas ainda existem em pleno século XXI.

A maldade humana, a supremacia étnica, o abuso de poder, a falsidade, a mentira, o controlo, a dissimulação, a escravidão, a tortura e a violação, de todos os géneros, que se espalham dentro e além-fronteiras, fazem-nos parar para pensar o que se seguirá.

Vivemos todos no mesmo planeta, estamos todos envolvidos. A ideologia do Partido é expandir o seu modelo totalitário, «tornar-se a superpotência hegemónica do planeta a meio do século – projeto conhecido como “sonho da China”».

Liberdade? Para muitos chineses, na China, é apenas uma palavra cujo significado nunca sentiram; censura, sim, conhecem bem.

Muitos foram exilados, torturados e mortos apenas por se atreverem a tocar nesse tema. Um deles foi o autor do conto “Pombo Selvagem”, Nurmemet Yasin, personagem real na vida e no livro, relata a história de um príncipe pombo que escolhera morrer para não ter de viver engaiolado, castigo que lhe sobreveio.

O Partido impõe inúmeros programas de reeducação, reintegração, dissimulados com nomes pomposos, de forma a ocultarem a verdadeira intenção de escravidão, violação, esterilização forçada, tráfico de órgãos e genocídio.

Um livro que nos prende. Merece ser lido com calma e reflexão.

«É útil para nos lembrarmos de que, sempre que compramos certos produtos incrivelmente baratos fabricados na China, esses produtos só são baratos porque a mão de obra foi forçada a trabalhar e não foi remunerada – isto é, estamos a comprar um produto feito por escravos e, assim, a financiar a escravatura».

Não é por acaso que o autor José Rodrigues dos Santos é considerado o escritor preferido dos portugueses, segundo os estudos do Prémio Cinco Estrelas e das Seleções do Reader’s Digest.

«Ler é buscar conhecimentos para aplicar em seu dia a dia, além de entender a sua própria cultura ou a de outra nação.»

(PEREIRA, Odete Aléssio).

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Novo Acordo Ortográfico
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Comments 1
  1. Sara Carvalho, gostei do teu artigo, dos teus spoilers , com ares de quem não diz nada e da realidade de opiniões exploradas! Também li está obra, do autor que aprecio muito. Tive a honra de o conhecer em Genebra e no qual encontro palavras troquei.
    Será sem dúvida um livro a ser lido por um público avisado!
    Parabéns querida escritora!
    Ana Mendes

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