Somos todos feitos de pedra e cal, poesia e mar, tristeza e saudade, sonhos e esperança. Somos todos feitos de burburinho e de pequenas grandes coisas que nos enchem a alma. De um dia poder ser.
Na vida, uns vêem o copo meio cheio, outros meio vazio, outros vazio. A certeza de que a vida vai continuar amanhã e nós com ela deveria dar-nos a esperança de viver todos os dias. Mas, a vida nem sempre assim é.
Há coisas na vida que não estão apenas erradas, estão além de tudo e pior, mal. A fome das pessoas está muito para lá de errada.
No delével passar de rompante dos dias inteiros, denota-se nos rostos das pessoas alguma angústia latente.
Apesar do Inverno parecer que não quer acabar mais. Apesar das notícias pessimistas com que nos bombardeiam o dia-a-dia. Apesar das contas no fim do mês para pagar, todos os meses o exercício mental atroz de como conseguir esticar cada vez mais o dinheirito. Apesar do murro político no estômago. Apesar de cada vez haver mais gente a viver na rua. Apesar de que nenhuma perspectiva boa nos é oferecida, os Portugueses aprenderam a sorrir, a cantar, a sair de casa e a investir em si mesmos todos os dias. Saem de casa com uma mão na coragem e outra na esperança.
Apesar da fama do triste fado, da gente da minha terra, apesar dos dias serem loucos e obscuros, apesar do vizinho ter morrido de cancro, a vida continua, a gente faz mais um esforço e vem à tona, esbraceja e lá se vai dar a alguma margem da vida.
Há pessoas que não vão nunca entender, que o dar tudo por tudo é pura e simplesmente querer ser um pouco louco, ao ponto de parecer borrifar-se para a morte, mesmo que esteja à nossa porta da frente todos os dias e continuar a pregar-lhe partidas, saindo pela janela.
Quando não se tem vontade, há uma prisão que se te revela.
Uma criança dizia, “É um dever de todos dar ao mundo uma razão para dançar!”. E eu diria que se o mundo não nos der essa razão, nós temos de a fazer renascer, para sobreviver à vida, porque, por vezes, é mesmo necessário caminhar em frente, sem olhar para trás.
Apesar dos apesares temos sempre Abril, o mês de todas as revoluções, de todas as esperanças renascidas, afinal a Primavera está quase a chegar e não falo do calendário. As flores já brotam das árvores e os passarinhos já cantam de madrugada nos seus ninhos. Há esperança. Apesar dos rostos, por vezes me devolverem olhares perdidos num vazio sem fim à vista. Apesar de todas as coisas más, que fazem ao nosso país. Há pessoas que se dão sem esperarem nada em troca. Não há melhor sensação no mundo que dar um sorriso, sem se esperar nada em troca e se receber em dobro. Há que ter esperança.
Há nos rostos das sucessivas manifestações sociais alguma esperança de que tudo acabe em bem.
Tenho enfim, a esperança de que sobreviverei como sempre, cavalo-marinho abandonado à sorte de uma maré vivida pelas esquinas de uma vida, um dia apaixonar-me-ei por uma estrela-do-mar e não haverá corrente ou, maré viva que me afaste de um sonho assim desencontrado, ao sabor dos ventos e da vontade das luas.
Intocável e omnisciente é a esperança, que nos acorda e faz sair à rua todos os dias. Dentro de cada um de nós há a esperança, que se pode fundir com a força do querer. É dela que devemos ouvir falar, é com ela que desejamos caminhar e é para ela que sempre deveremos querer marchar.
Abril, águas mil. Bem, o Março já foi o que foi… Desejo, tenho em mim a esperança de que quando Abril chegar, se abram os braços do nosso Sol amado e nos liberte deste Inferno de parecer que todos estamos a viver em Londres por um ano.
Que venha Abril, que chegue depressa e com ele os sorrisos e os abraços, mais os cravos por companhia.
Acredito na esperança como arma de tudo poder querer ser. Viu-se de geração em geração, apesar dos infortúnios e da fome. Nenhum regime ditatorial conseguiu matar os sonhos e a esperança. A esperança é sempre a última a morrer. A liberdade de poder ter esperança, como os sonhos, isso ninguém nos tira.
Entro pela noite sempre a cantar a mesma canção, sonho sempre o mesmo sonho de Verão, sonho o rosto cansado das estrelas, a milhas de distância, não se apaga ainda a luz da esperança. Sorrio.
A esperança do ser humano é capaz de mudar o destino das coisas. Saber que Abril é uma oportunidade, saber que desejamos Abril.
A esperança está ligada com o optimismo. Saber que as flores estão a florir, os pássaros a cantar e que o Sol está a caminho. Talvez, por já não haver pachorra para o pessimismo a gente vai continuar, dêem-nos o alento que encaixe, que nem gorro nas nossas cabecinhas complexas.
Deixem as marés vazar, o degelo acontecer, o mundo acabar, mas preservem o antídoto, a mão na mão que acalma, qualquer que seja a ruga na testa preocupada com um futuro que já não existe, deixem-nos sonhar, nunca nos levem a esperança de que o amanhã vai ser melhor. Contrariando a corrente para onde nos querem levar, tenazmente todos os dias desfruto do brotar de uma esperança. Sorrio de novo.
Aguardo as palavras, mesmo que em silêncio, numa folha em branco, somente uma frase, um olhar qual síntese em flecha certeira e matadora de um vício, uma esperança vã. Um sorriso.
O optimismo é o motor da vida, a esperança é uma cadeira vazia à espera de ser ocupada.