548 Days: Abducted

“Na verdade, a mente é a fonte da escravidão e também a fonte de libertação. Estar preso às coisas deste mundo: isso é escravidão. Estar livre delas: isso é libertação.”

– em Os Upanishades, p. 73

Nada interessa para este texto o que significa Upanishades. Os interessados procurarão sabê-lo através de conteúdos fidedignos e bibliográficos.

Porém, registo como introdução um dos seus ensinamentos que, muito reporta à temática que escolhi para um novo artigo RS. Começam a ser complexas as construções de tópicos com a intensidade dos que se apresentam, pois não sendo para fazer questionar e reflectir e, ou criar discórdia pelo impacto que têm na vida real e no quotidiano da sociedade actual, dificilmente os traria aqui. Peco pela morosidade. Porque sem o timming certo, estes conteúdos nunca seriam objectivamente expressos e assinalados.

548 Days: Abducted é uma série documentário que retrata a história de uma jovem espanhola, ludibriada por um indivíduo que conhece através de plataformas digitais e que, induzida pelas semelhanças das suas ideologias, diálogo permanente e influência psicoemocional, é seduzida por este – guru de uma seita, levando-a a fugir para o Peru, logo que completa a maioridade.

“A liberdade política é impedida quando há ameaça sobre o pensamento e não sobre a acção.”

Hannah Arendt

Nesta série, não se fala de liberdade política. Mas, de liberdade de pensamento e sobretudo, de liberdade de acção. De submissão, violência psicológica e emocional. De fundamentalismo religioso e espiritual. Talvez até, de comportamentos compulsivo-maníacos que agridem a independência de qualquer indivíduo. E, pergunta-se o porquê? Como é possível alguém se deixar influenciar ao ponto de viver desumanamente?

Aliás, não se fala. Apenas se testemunham os advérbios de tempo, modo, lugar, intensidade, negação ou dúvida e, da angústia e desespero para a família que, desesperada e esperançosamente nunca deixam de procurar a filha, Patricia Aguilar.

É incómodo, desconcertante, absurdamente cativante. Porque ronda os meandros do psiquismo, a mente humana e a sua fragilidade. Da vulnerabilidade do ser humano, da necessidade de submissão ou controle e a passividade perante a dominação da sua liberdade.

E para se entender, muito simplesmente, como é fácil ser-se influenciado por outro e ainda mais por um grupo, aqui fica uma pequena experiência social foi feita em 2016.

Experiência Social

Para António Madaleno, “as Seitas Destrutivas exibem um grau elevado de totalitarismo por dominarem a vida dos seus membros. A dominação ideológica é geralmente complementada e apoiada a nível social por medidas que diferenciam o grupo e isolam os membros da sociedade. Conhecer os mecanismos de manipulação psicológica e controlo usados, o impacto nos seus membros” é da maior relevância para quem acredita não ser influenciável. Neste mundo de inteligência artificial e facilitismo interactivo, engane-se quem pensa nunca a isso ser induzido. Inconscientemente, talvez por necessidade de pertença a algo. Ou, ainda porque a sua própria individualidade o amedronta e isola, encontrando noutros e em grupos, esse sentimento de inclusão.

Tal como no anterior vídeo, a Experiência de Asch, uma das investigações mais antigas e populares da psicologia, apresenta o poder da influência da maioria e a conformidade perante o grupo.

São estudos curiosos que abordam questões muito além das que são do entendimento comum, mas que exemplificam, com clareza e simplicidade, o poder sobre a mente humana.

No caso de Patricia Aguilar, o seu isolamento e comportamento pouco social, muito próprio de ser adolescente, tornaram-na curiosa de ideologias ocultas ou esotéricas, promovendo o obscurantismo, pela ingenuidade e imaturidade, e do quão fácil é pesquisar no motor de busca da internet. O Esoterismo é o nome genérico que evidencia um conjunto de tradições e interpretações filosóficas das doutrinas e religiões – ou mesmo das Fraternidades Iniciáticas – que buscam transmitir um rol acerca de determinados assuntos que dizem respeito a aspectos da natureza da vida que estão subtilmente ocultos. (Wikipédia)

Isolada do mundo ao redor e a sentir-se incompreendida pelos seus, Patricia procura refúgio em alguém que se denomina de O Messias e cujos ideais a fascinam. Facilmente é influenciada a fugir da sua família para ir de encontro ao “Seu Senhor”.

Para compreender a influência (neste caso pela negativa) de uns sobre outros, e no que concerne a fundamentalismo, há um misto de notícias à volta deste tema. Lembremos uma em Portugal de há bem pouco tempo atrás: Reino do pineal: a misteriosa seita que se instalou no interior e quer formar um estado soberano dentro de Portugal. E, que posteriormente, foi notícia por assuntos mais graves. Também outros grupos; conhecidos por todos os que lêem estas linhas; com critérios de admissão específicos e cujos elementos que detém o poder, ou “estão no topo do grupo”, influenciam e têm controle sobre a acção e pensamento dos sujeitos que deles fazem parte. Situação normalizada e aceite e, mesmo sem a exposição social, internamente promovem esse tipo de influência e poder sobre os outros. Cultos religiosos cujos nomes não interessam.

Os casos de assédio em instituições de renome, como a do fundador da Confederação de Yôga ou do Bikram Yôga. Igualmente  patente o elevado grau de influência do guru, perante o conformismo de grupo, e das próprias vítimas.

Afim de concluir este artigo RS, deixo-vos com uma sugestão, ou influência, se assim preferirem, de um outro filme que, ainda que nada tenha a ver com 548 Days: Abducted, vai de encontro ao mesmo, pela forma como retrata a psicologia da mente, dos grupos e o domínio sobre a individualidade do sujeito e o impacto que tem na liberdade ou opressão dos mesmos.

Experimenter

Em 548 Days: Abducted, Patricia e, não só, são castradas da sua liberdade de pensamento e acção; isoladas da família, da sociedade e impedidas de amadurecer enquanto elas mesmas, na sua individualidade, emocional, social, física e psicológica; por um indivíduo só. E o depois… ter de “reaprender a caminhar”, como se o seu cérebro voltasse a ser criança.

Sempre com uma nota de esperança; porque a família de Patricia Aguilar nunca a abandonou, procurando incessantemente; foi caso de notícia no país e no mundo. E esta história poderia ter outra realidade. Quantos são que não têm a mesma sorte?

“A liberdade é o nosso bem mais precioso. Ao confrontar a liberdade com a disciplina, se esta violentar aquela, opte pela liberdade.”

– Mestre DeRose

Nota de Alerta:

Se precisa de falar com alguém, procure ajuda no seu círculo familiar e de amigos. A internet e as redes sociais são facilmente influenciáveis  e dificilmente encontrará alguém que se preocupe realmente consigo.

Nota: este artigo foi escrito seguindo as regras do Antigo Acordo Ortográfico
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E tu? Onde te encaixas?

Comments 1
  1. Gostei de ler mas não sei bem onde me posicionar. Sempre considerei os meus amigos os melhores psicólogos mas há fases altamente perturbadoras em que só recorrer a amigos e familiares não chega. Porém, é importante procurar orientação profissional devidamente credenciada. Mas é um alerta importante para muita gente. Principalmente os mais jovens. Obrigada Carmen.😉

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