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Uma Separação

Uma Separação é do tempo-fronteira entre a época em que abusávamos do torrent para sacar filmes, séries e música e o aparecimento do streaming, conceito que veio libertar muitos gigabytes da memória nos nossos dispositivos. Nunca vi nada em streaming (as gravações automáticas e o encanto por uma sala de projecção secaram essa necessidade). Em 2011 saquei Uma Separação (vi no portátil em que escrevo este texto). O filme havia “limpo” cinco prémios no Festival de Berlim incluindo o Urso de Ouro (Melhor Filme) e os Ursos de Prata (para Melhor Actriz e Melhor Actor). Não sei se foi inédito mas certo é que tamanho reconhecimento colocou a minha expectativa nos píncaros.

O filme, do iraniano Asghar Farhadi (que eu então desconhecia), é falado em persa obrigando por isso a legendas. Uma vez que a pelicula não havia ainda entrado no circuito comercial, apenas consegui legendas em inglês, e que legendas… levei longos minutos a sincronizá-las com as falas (tive que o fazer no inicio do filme pois, ao não entender nada, não o conseguiria fazer a meio). Assim que me refastelei no sótão de casa da minha mãe para tranquilamente disfrutar de uma potencial obra-prima constato que, por cada vinte frases faladas na película, apenas cinco eram legendadas! Além disso, a qualidade das legendas era tal que, entre outras falhas, os géneros iam alternando (um “she” virava para “he” que voltava a ser “she”…)… pareciam ter sido escritas por um esquizofrénico embriagado com uma overdose de síndrome de Tourette.

Vou poupar aqui os palavrões com que reguei o caldo da minha frustração naquele momento. Basta testemunhar que, apesar destas vicissitudes: Adorei!

O filme prendeu-me do início ao fim. A técnica utilizada no argumento por Farhadi e que ele viria a repetir (e abusar, diria eu) nos filmes seguintes vai destapando os factos que, em tempo real, vão mudando a nossa percepção da história. Cheguei ao fim rendido a um enredo sem bons nem maus, com a perfeita noção de que havia visto uma obra maior. O Globo de Ouro e o Óscar foram os mais previsíveis de que me lembro e a história daquele divórcio marcou-me pela mestria com que foi construída.

Um filme que corre a um ritmo alucinante e de cuja qualidade tive consciência plena quando, um ou dois anos mais tarde o vi numa fria noite lisboeta, no Cineconchas, provavelmente enrolado numa manta que mal conseguia conter o meu frio mas também a minha admiração: que deleite poder testemunhar obras assim.

A minha estupefacção ficou registada num texto que escrevi aquando da primeira visualização. Arrebatou-me sem ter entendido mais de metade do que nele foi dito: o poder da imagem e a qualidade da construção da história colmataram a falta de entendimento que o Cineconchas viria a corrigir.

Não existem filmes perfeitos mas alguns agitam o véu através do qual conseguimos adivinhar os contornos da perfeição. Uma Separação aproxima-se dessa obra ideal.

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