Com metros de altura, resumido a centímetros. Com uma capacidade nata de mitose. Com um gosto particular para o sofrimento. Um louco desprovido de vergonha, riquezas e idades. Com uma cara nada simpática nem acessível.
Um egoísta, reflexo de muita coisa, mas pouco evidente. Um cobarde em silêncio.
Sim, ele está nas modas. Todos sabemos que há modas e modas. Umas mais incomodativas que outras.
O bicho cancro está na moda. Deve ser dos poucos êxitos que não são invejados e desejados. Aqui, pelo contrário agradece-se por ser na galinha da vizinha e não na nossa. Não dizemos “ah e tal já viste, ela tem e eu também gostava de ter”. Mal de nós.
Até ao dia em que a gabardine de pelo que está nas montras há anos se torna tua e tens de a carregar. Não há hipótese de não usares e a deixares em casa. Vais ter de ir ao alfaiate as vezes que forem necessárias até se adequar com a tua silhueta, deixar no ar os planos para os meses que se seguem, porque no dia de amanhã podes estar a fazer de figurino.
Vais ter de perceber que aquela terá de ser a argumentaria para nos dias que vão surgir. Vais dizer que está tudo bem, que acabará tudo bem, quando sabes que é possível que isso não aconteça.
Vais tremer de medo como nunca pensaste ser capaz. Vais perguntar-te mil vezes porquê a mim.
Pensas que vives num pesadelo e até podes começar a escrever a tua esperança num livro titulado “Também há Pesadelos com Finais Felizes”. Como conheço alguém que o fez.
É possível que desistas algumas vezes de o escrever. Que te faltem as palavras, a força e a determinação. Vai-te faltar tudo menos a esperança que aquilo aconteça a qualquer outra pessoa no mundo do que em tua casa.
Mas aconteceu. E devastou tudo e construiu ainda mais. Tornou a carpete áspera da sala no tapete mágico do Aladino, onde todos dormiam para estarem mais próximos.
Vais deixar de ver sacos de soro como simples saquetas e passarão a ser o caldeirão do Asterix. Vais deixar de te sentir só filha e capacitas-te que a tua mãe é a rainha da savana tal como no “Rei Leão”.
Conseguirás aperceber-te que a força do Rocky é tão verdadeira e expressiva quanto daquela que carrega o fardo. Não vais duvidar que aquelas cenas de filmes de meninas que falam com as amigas a combinar viajar pelo o mundo inteiro se podem realizar mesmo, quando tu própria tiveres essas conversas.
Por momentos, alguns e mais do que desejavas, vais achar que estás numa guerra e que nem o som do pianista te consegue acalmar.
Facilmente compreenderás que o capitão que vai na proa do barco é fantástico e, por mais que grites os outros, não vão perceber o que dizes e a tua família passará a Bélier, surda e penosa.
Vão sentir que são iguais, que no seio familiar já não há palavras que conjugadas deem um poema e aí pensas que já estão mortos.
Mas melhor que tudo isso, é estares a jantar fora num dia nada festivo e pensares o quanto a vida é bela. E nesse momento quererás, com toda a força, viver o aqui e o agora.
A ti, cancro, que no final do filme até que foste um bom rebelde. Que obrigaste alguém a vestir uma gabardine durante várias estações, dá um bocadinho de descanso às pessoas do mundo. Faz aquelas pausas tão necessárias no cinema para todos falarmos sobre o quão boa é a nossa vida e a valorizarmos.
Ao Adamastor que assustava os marinheiros e hoje assusta os tripulantes desta viagem que é a vida. Mete-te num buraco bem fundo e avalia a beleza colateral da vida das pessoas e não as ensines da forma mais difícil.
De uma louca por cinema, mas que dispensa bem as tuas cenas,
Preciosa