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Portugal e a Europa. Para onde vamos?

Reino Unido em processo de saída da União Europeia. França no rescaldo de uma eleição que pôs à prova a integração do país na União, entre outros assuntos importantes. O crescimento do populismo e o ressurgimento das fronteiras no continente. Refugiados que continuam a chegar ao território europeu e vários países envoltos em imbróglios sobre o que fazer com eles. No meio disto tudo, parece que Portugal tornou-se uma “ilha de estabilidade”, com números económicos e do desemprego no país a apresentarem sinais de melhoria.

Porém, sabemos todos que a situação ainda não é a ideal e que o passado recente ainda é vivo nas recordações de muitos portugueses. Os anos difíceis vividos desde a deflagração da crise financeira mundial, em 2008, fizeram com que a questão “vale a pena continuar na União Europeia?” ganhasse cada vez mais força, muito embora as probabilidades de uma eventual saída do bloco sejam as mais remotas. Nesses 31 anos de pertença à Europa a 28 (ou 27?), muita coisa mudou no país, mas o que Portugal efetivamente ganhou com isso?

Nas três décadas de Portugal na UE, embora os tropeções tenham sido grandes e inúmeros, é inegável que o país deu um salto de desenvolvimento e qualidade de vida. De lá para cá, houve melhoria nos cuidados médicos e nas redes de saúde do país, a esperança média de vida aumentou, a mortalidade precoce caiu de forma considerável, trouxe-se ao país uma melhoria nas infraestruturas que não seria possível, ou talvez fosse bastante mais difícil caso não se tivesse aderido ao bloco. A escolarização da população aumentou consideravelmente e o número de jovens titulares de um grau académico também.

A “ilha” à beira do Atlântico, presa ao continente europeu, eventualmente tinha que se abrir a ele e derrubar as barreiras que a deixavam isolada. Isso estava bem expresso no sector agrícola, atrasado em várias décadas e marcado pelo protecionismo em relação ao resto do continente. A agricultura era camponesa, sustentada sobretudo pelos próprios agricultores, muitas vezes pobres. Praticamente não havia mecanização e era pouco o desenvolvimento técnico. A Política Agrícola Comum forneceu os subsídios necessários para que o país desenvolvesse o sector, que actualmente é bastante forte no contexto global é responsável por quase 20% do total das exportações portuguesas.

No primeiro dia de 1986, Portugal entrou na então Comunidade Económica Europeia (CEE), nove anos depois de ter formalizado o pedido de adesão. Havia apenas 12 anos que a democracia havia regressado ao país e muita coisa havia por se fazer. Apesar de o regime ditatorial ter tentado uma aproximação com o espaço europeu em desenvolvimento, de forma a trazer maiores investimentos para o país, a recíproca não era verdadeira: a Comunidade Económica não se interessava em negociar com um governo colonialista e com claros sinais de decadência.

Além disso, mesmo com a deposição do regime de Salazar, Portugal ainda estava envolvido em diversas questões mais urgentes, tais como a guerra em Angola e a fuga dos portugueses que lá residiam, as duas intervenções do FMI para resgatar a economia que convalescia, já para não falar da própria consolidação das forças políticas internas e o jogo pelo controlo do país. Num contexto como esse, não era possível traçar estratégias a longo prazo. Apenas nos anos do governo de Cavaco Silva como primeiro-ministro é que os problemas com as nações africanas tiveram um período de tréguas, no qual foi possível focar atenções no projecto europeu que se desenvolvia e na participação que Portugal poderia ter.

É verdade também que houve abusos governamentais e projectos de investimento que se concluiu terem sido de pouco proveito para o crescimento sustentável do país. As autoestradas que atravessam o país, muito embora sirvam como meio de agilizar o transporte rodoviário, exigem grandes custos de manutenção, parte dos quais foi repassada para os condutores com a instalação das portagens. Estádios de futebol construídos para o Euro 2004 nunca tiveram grande serventia depois do evento. A entrada na moeda única e a expansão do crédito fácil criaram bolhas de investimento que eventualmente acabariam por estourar.

Parcerias público-privadas de procedência duvidosa e a criação de fundações e órgãos públicos desnecessários canalizaram muito dinheiro para fins escusos. O crescimento do número de funcionários públicos, a política de emprego estável da função pública e o inchamento dos bónus para os cargos mais altos acabaram por tornar o Estado português demasiado grande e pouco eficiente. Práticas como a política de gastos públicos desacompanhados de rigoroso controlo fiscal, a criação de dívida pública através de empréstimos e a má utilização dos fundos estruturais europeus desde a entrada do país na CEE acabaram por cobrar o seu preço. Eis que a crise económica bate à porta e começam as cobranças para “pagar a conta” pelo desenvolvimento.

Muito embora o país esteja num período de recuperação económica desde os últimos dois a três anos, ainda é preciso enfrentar muitos problemas. A falta de emprego empurrou muitos jovens portugueses para a emigração na última década e os seus efeitos são significativos face a baixos índices de natalidade e a uma população cada vez mais envelhecida. Apesar desta realidade, os números do desemprego em Portugal já andam abaixo da casa dos 10% actualmente, embora a persistência da precariedade no mercado de trabalho ainda seja um mal a ser combatido.

O que é possível esperar para o futuro? Quais são os desafios que aguardam Portugal como Estado-membro da União? De imediato, é possível referir a necessidade de gestão dos fluxos migratórios de refugiados e imigrantes que chegam de países cujas economias passam por graves desequilíbrios. A ameaça do terrorismo no espaço europeu e a crescente presença do populismo nacionalista, embora não reproduzidas em Portugal, devem ser tratadas com extrema atenção, pois é a legitimidade democrática do bloco europeu que se coloca em jogo. O princípio de livre circulação de pessoas e bens, um dos principais pilares do projecto europeu, enfrenta o seu teste mais difícil.

Nos trancos e barrancos, e apesar de todos os percalços que marcaram estas três décadas de Portugal na União Europeia, o país conseguiu dar um salto palpável em termos de qualidade de vida e ainda é de importância estratégica que o país permaneça no bloco. A gradual recuperação económica dos últimos anos, embora ainda precise de ser acompanhada de algum mecanismo de controlo da dívida pública, deve servir como ponto de partida para que Portugal mantenha a estabilidade do actual momento e crie um caminho de crescimento sustentável e equilíbrio económico mesmo num ambiente de crescente incerteza sobre o futuro da União Europeia.

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