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O perigoso optimista

Há duas atitudes que se confrontam, inadvertida ou inconscientemente na vida. A postura optimista e a sua irmã, nos antípodas, a postura pessimista. Duas irmãs desavindas, ou nem por isso.

Somos denunciados numa destas posturas, várias vezes pela vida. Uma vez por outra seremos pessimistas, ou estamos numa posição muito próximo de o sermos. Outras, optimistas, mas nem tudo é, afinal, assim tão transparente, ou cristalino. Acontece, na vida. Acontece na sociedade, na profissão, mas, neste particular, interessa explorar como acontece na vida política e como se guiam, por uma postura predominante, ou teimosamente persistente, se orientam os que decidem na vida política e, bem assim, económica.

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Há que adicionar umas nuances, para melhor entendimento do assunto. De facto, há os optimistas inescrupulosos e os pessimistas escrupulosos, ou judiciosos. Qualquer coisa como um temperar de extremismos pouco recomendáveis, ou a procura de um bom senso, que é real, ou que se julga real, mas é o mais fantasioso possível. Ou falacioso, porque está carregado de perversidade.

Passando a explicar, com exemplos, para o que alerto, sentem-se por favor tranquilos e saiam das caixas dos vossos muito perfeitos ideais clubísticos, das escolhas e opções políticas.

Um optimista inescrupuloso é, por exemplo, alguém que acredita, ou quer fazer acreditar num intervencionismo estatal do tipo keynesiano, para acudir a uma economia paralisada, a caminho acelerado da degradação, da depressão económica e do desastre financeiro, injectando avultados fundos inexistentes internamente, financiando-se, ou diria, endividando-se e ao seu país, de forma muito irresponsável, num elogio tresloucado ao mais insane dos históricos que a História preferiria esquecer. Vende-se, assim, o futuro das próximas gerações, porque tudo é hoje dispendido, para pagar sempre depois, sempre no futuro. Os exemplos, serão conhecidos e, nomeadamente, trouxeram-nos à conhecida desgraça. Digo, em Portugal, como em muitos países bem maiores, mais ricos, mais capacitados para uma recuperação, mas nem assim mais próximos de uma salvação de bancarrota. Alguém, para quem a desconfiança numa mesmo que escassa força humana do empreendedorismo, é causa de urticária.

Outro optimista inescrupuloso é o que acredita com uma fé que não aceita discussões. Um optimista inescrupuloso (ou será cego?) dificilmente aceita divergência de ponto de vista e o que o define, precisamente como optimista, alguém para quem a questão de fé é sempre mais forte e de maior valor do que a questão da razão, da inteligência emocionalmente racional, ou de qualquer forma do que, vulgo comum, chamamos de sensatez. Acredita num mercado (por vezes fantasioso, porque quase inexistente, se nos agarrarmos ao purismo do termo), nos mercados, na sua natural auto-regulação, na força mobilizadora da inciativa privada, tanto mais pujante quanto menos regulada. Alguém, para quem a regulação é o inimigo a combater.

Um terceiro optimista inescrupuloso e muito perigoso, mas com uma seita de fiéis seguidores, também eles perigosos, é quem pretende corrigir os males provocados pelos primeiros, para atingir um dia a suprema libertação que leva aos segundos, ou que se insere nessa forma liberal de fé no poder do mercado mais livre possível e defende e actua numa política de demolidora austeridade. Com ela, faz aumentar sempre, sem conhecida excepção no mundo, a dimensão da dívida soberana, os custos do Estado e o fardo financeiro das famílias. Um buraco de quem ninguém vê o fundo. Estes optimistas inescrupulosos vêm sempre uma realidade que mais ninguém vê e nunca observam a desgraça ao seu redor, que lhes é simplesmente inobservável.

A atitude, de qualquer destes tipos, ou estereótipos, é a de fé. A de sempre ser levado a acreditar, por sempre o acreditar vembem à frente do desconfiar, desde já de si mesmo e ser, então levando a apoiar-se nos outros, observar todos os demais, pensar com eles, trabalhar com eles e nunca os substituir no seu pensamento. Esse, será sempre um pessimista com escrúpulos, uma pessoa escrutinadora da razão, não apenas sua, mas de todos, da sociedade. Desconfiar de receitas e de certezas, destas principalmente.

Levar o Estado a investir na sociedade, massivamente, distribuindo fundos que esse Estado não possui, endividando uma sociedade, porque sempre se acredita que num futuro é possível resolver esse nível de endividamento, pois a recuperação económica, através da criação de emprego, de aumento subsequente do consumo e de uma onda assim gerada de produção de riqueza, por esta via, é próprio de um optimista, não um qualquer, mas de um inescrupuloso, mas optimista, ainda assim e sempre.

Do outro lado, os que acreditam no funcionamento de uma economia e país, pela via mais liberal possível, porque os mercados sabem funcionar de forma perfeita, porque o Estado só estorva, porque a regulação é um obstáculo de crescimento e desenvolvimento, é também um incorrigível optimista inescrupuloso, pois a sua fé numa falácia que a História desmente é um castelo inexpugnável.

Os terceiros, que defendem a imposição de uma austeridade, sempre a ser paga por quem não tem opção e escolha, ou fuga, são provindos mais do segundo grupo, mas igualmente provêm dos defensores da economia planificada pelo Estado. Estes, provavelmente os mais perigosos, por usaram de muitas falácias, ainda por desmontar pelos dias de hoje. O empobrecimento provocado não faz do regredir uma economia e uma sociedade, recuando-a para patamares onde não se devia regressar, usando o termo ajustamento, da forma mais perversa, ou mesmo cruel, para fazer acreditar num caminho de redenção de pecados económicos e de excessos cometidos. Ocultando a raiz fundadora do projecto, o do interesse maior do sistema financeiro, bem fácil de desmistificar pela simples verdade histórica de nunca em algum tempo ou algum lado, uma política de austeridade ter resultado numa recuperação de um país, de o ter tornado melhor, de o ter reformado sequer, de lhe dar um futuro que outros teriam comprometido, ou roubado. Este grupo, adora e cola-se a palavras e tenta nem ver as evidências, aproximando-se bem mais do conceito de seita, do que do que fé de uma religião.

O regresso destes pessimismos não existe pela mesma via, mas apenas pela opção de tomar uma outra, nem paralela, nem sequer próxima, mas do pessimismo judicioso, da atitude bem mais científica do que de fé, da aceitação do “nós” e rejeição do “eu” puro, que é o cartão de identidade dos optimistas inescrupulosos.

O caminho da austeridade é tão só a continuidade do caminho do irresponsável despesista defensor do investimento salvador do Estado. O caminho do liberal económico é o mesmo do acérrimo defensor da austeridade. É um ciclo de vício optimista, porque sempre acreditam num qualquer futuro melhor para muito breve. Que nunca chega. É um ciclo destruidor e suicida.

A sensatez, imagem de marca do pessimista judicioso, responsável e serenamente seguro, porque se alimentou das convicções nascidas da observação real do mundo e do ensinamento da História, é o único caminho que inverte a espiral suicida. O problema… é não se poder vislumbrar um resquício dessa sensatez, algures, em algum lugar do mundo que nos toca, do mundo político, económico e financeiro. Contudo, é por aí que teremos de descobrir o futuro, esmagando o até hoje vigente optimismo decadente, pernicioso.

A considerações mais ou menos teóricas, como as que Roger Scruton eloquentemente tece, na sua obra As vantagens de ser pessimista, acresce a realidade. A realidade existe, mas é apenas observável por quem foge do preconceito, da cegueira por opção, ou, como o intelecto brilhante de Scruton definiu, do optimismo. Pelo menos do que não escrúpulos. E, hoje a realidade já não é o absurdo do optimismo que desencadeia a febre do investimento dos Estados, do despesismo apenas amigo das redes de influências corrompidas de há alguns anos, do “fazer hoje para ser pago no futuro, por futuras gerações”.

A História é um manancial de exemplos de optimismos perigosos. A Revolução Francesa, a partir da promessa de vida melhor (que acabou por ser após o Grande Terror e após Napoleão Bonaparte), é um exemplo maior. Igualmente o são o Maoísmo, a Revolução Russa, os regimes ainda hoje de Cuba, da Coreia do Norte, ou qualquer ditadura, afinal. Como o foram os anos enganados de Thatcher, de Reagan, os iludidos seguidores de Keynes, ou os seus opositores, de Hayek.

Hoje, a realidade, ainda sem a brutalidade toda em cima de nós, é a da Austeridade, tornada inaceitável, violentadora e inaceitável, pelas mais recentes revelações, de que muitas suspeitas já existiam, dos lucros da Banca do centro da Europa, da Alemanha, especialmente, com as dívidas soberanas, com os programas de resgate. Só para recordar, a Alemanha, a Banca e o Estado podem ter lucrado mais de 100 mil milhões, apenas com a Grécia. Um quarto do total dos resgates efectuados no âmbito dos programas de austeridade impostos. E, nesse caso, a maior exportação alemã. Imagine-se o que terá a lucrar a Alemanha com todos os programas que gerou e forçou pela Europa “resgatada”.

Como se não bastasse o futuro que nos é literalmente roubado, ainda acresce esse escandaloso negócio, feito com toda a arrogância, à custa do empobrecimento, literal também, de povos demasiado passivos. E isto já pouco, ou nada, tem a ver com optimismo, na senda do que Scruton nos explica. Pode ter, para uns quantos fiéis do neo-liberalismo, mas nunca para os servidores da “maior exportação alemã.”

É contra estes optimismos, genuínos, mas perniciosos, ou contra os que de optimistas se servem, que todo um mundo de sofredores da realidade, os pessimistas judiciosamente sensatos se tem de levantar.

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