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[Novembro] A cor em Schindler e o Muro em tons de cinzento

Uma boa motivação é o necessário: compaixão sem dogmatismo, sem filosofias complicadas; apenas a percepção de que os outros são irmãos e irmãs e o respeito pelos seus direitos e dignidade humana. Que nós nos possamos entreajudar: esta é uma das nossas únicas capacidades humanas.

(XIV Dalai Lama)

Corria o ano de 1993 quando o cinema norte-americano arrebatou o Mundo com a estreia de “A Lista de Schindler”. Sob a brilhante timonada de Steven Spielberg, a longa-metragem relata o pouco convencional heroísmo de Oskar Schindler, responsável pela salvação de mais de mil judeus da longa e obscura mão do holocausto.

Numa realista e comovente interpretação dos factos ocorridos entre 1939 e 1945, aquando do extraordinário feito de Schindler, o filme, verídico nos factos e nas vivências, é uma memória paradoxal entre o triste reconhecimento de um dos mais negros Zeitgeists, e a compaixão humana que dele brotou.

SchindlerPoster

Reminiscentes, ficaram as brilhantes interpretações dos dois grandes protagonistas, Liam Neeson (Oskar Schindler) e Ralph Fiennes (Amon Göth), respectivamente nomeados para o Óscar de Melhor Actor e Melhor Actor Secundário, o admirável trabalho de Spielberg, reconhecido com o Óscar de Melhor Realizador e, acima de tudo, a mestria do contar de uma história a que se torna inexequível ficar indiferente.

“A Lista de Schindler” não é apenas uma obra-prima do cinema; é um soberbo exercício de introspecção, até mesmo para aos que da Solução Final não fizeram parte, vítimas ou perpetuadores.

Eu estava decidido a fazer tudo aquilo que estivesse ao meu alcance para derrubar o sistema.

(Oskar Schindler)

Oskar Schindler trilhou um caminho ambíguo ao longo da Segunda Guerra Mundial, eventualmente tornando-se no mais improvável dos heróis. Nascido na actual República Checa, o industrialista viria a salvar mais de mil e duzentas vidas judaicas das câmaras de gás, nos campos de concentração nazis. Naquele que começou por ser um esforço egoísta, em benefício económico do próprio, Schindler tornou-se proprietário de uma fábrica de esmaltes, na cidade de Cracóvia, Polónia, ocupada pelas forças de Hitler.

Na expectativa de aumentar a fortuna pessoal, o objectivo era tirar partido do esforço de guerra, produzindo armamento com mão-de-obra barata, judaica. No advento do crescimento empresarial, cedo se viu enredado na vida social nazi; frequentava as festas mais elitistas dos oficiais nazis, adaptando a vida pessoal ao rendimento em exponencial crescimento, fruto dos lucros da fábrica, que geria em consórcio com o contabilista judeu Itzhak Stern. O que começou por ser, tão somente, um ganho económico, transformou-se num empreendimento altruísta, marcado por um episódio em particular na vida de Schindler. O empresário viria a testemunhar, aquando de um dos inúmeros raids perpetuados em Cracóvia, o fuzilamento de alguns dos seus funcionários, enquanto outros estariam de partida para o campo de concentração de Płaszów.

Foi este o momento de viragem que marcou a materialização da “Lista de Schindler”. A proteção dos ‘seus judeus’ tornou-se a ambição de Oskar Schindler que, conluiado com Stern, subornou oficiais nazis, distinguiu trabalhadores inaptos como essenciais para a fábrica, nesta altura instituída como essencial para o esforço de guerra, enfrentou a SS recusando-se a entregar os trabalhadores fabris, combatendo a dúbia burocracia do regime. O improvável humanitário chegou a ser preso três vezes, nenhuma das quais antecedida ou precedida por julgamento. Perdeu a fortuna, gasta na frutífera tentativa de preservar as vidas dos “judeus de Schindler”, como viriam a ser apelidados.

lista de schindler 1A Lista de Schindler é um retrato cinematográfico desta que é a veracidade dos acontecimentos, entrecortado com laivos de comovente simbolismo. Rodado a preto e branco, a cor vermelha é a única a destoar do cinzento predominante; a cor vermelha do casaco de uma criança, uma garota, cujo vislumbre é retido eternamente, muito depois da fita magnética parar de rodar.

A imagética da menina que enverga o agasalho encarnado é uma atroz lembrança do drama da Segunda Grande Guerra, quando o característico casaco vermelho transparece por entre um aglomerado de cadáveres.

A mensagem d’A Lista é bem mais do que uma penosa recordação; é uma ode à compaixão. “Aquele que salva uma vida, salva o Mundo inteiro”, evangeliza Ben Kingsley (Itzhak Stern), na recta final da longa metragem.

Ninguém tenciona construir um muro! 

(Walter Ulbricht)

O mês de estreia d’“A Lista de Schindler”, em Novembro de 1993, é coincidente com um outro marco histórico, precedente à Segunda Grande Guerra, dela germinado, e dela reminiscente: a queda do Muro de Berlim.

Derrubado o monstro bélico potenciado pelo infame Adolf Hitler, emergiu o combate fantasma, a proclamada Guerra Fria, onde o combate se fez de palavras e ameaças indirectas entre os Estados Unidos da América e a União Soviética, leia-se, entre o capitalismo e a liberdade democrática, e o socialismo totalitário.

Na Berlim alemã, a divisão foi bem para além do simbólico eufemismo. Em Agosto de 1961, a divisão global entre o capitalismo e o socialismo tornou-se metafísica; nesta data, elevou-se o muro que separava Berlim Ocidental, daquela Oriental. Tal como a menina do casaco vermelho, a empreitada tornou-se numa evidente e dolorosa bandeira das tensões políticas, culturais e ideológicas, desta vez potenciadas pela Guerra Fria.

Erigido pela República Democrática da Alemanha (RDA), cujo líder proferiu pela primeira vez a palavra ‘muro’ em contexto político, o extenso bloco de cimento separava a Berlim Oriental e socialista da Ocidental e democrática, apoiada pelos Aliados capitalistas. A divisão surgiu no pós-guerra do segundo conflito a nível mundial, na Alemanha ocupada pelas forças dos Aliados e pela antagónica União Soviética.

O braço de ferro ideológico teria assim início, passados apenas 2 anos desde o fim do regime Nazi, altura em que as dicotomias políticas começaram a pulular e a instigar fricções entre o liberalismo e o socialismo.

Mr. Gorbachev, tear down this wall!

(Ronald Reagan)

A 9 de Novembro de 1989, 28 anos depois da sua construção, o muro foi finalmente derrubado, não sem antes serem contabilizadas centenas de mortes, potenciadas por tentativas de fuga mal sucedidas. Por inteiro decorado com grafiti colorido, contrastando com a época cinzenta que retrata, do lado Ocidental, no muro retratou-se a

berlin20wall20freedom

liberdade de expressão, qual hino à autonomia oferecida pela democracia. Do lado oriental podiam ler-se inúmeros expressionismos contra a opressão a que eram subjugadas as gentes do regime totalitário.

Tal como Schindler ofereceu nova esperança aos seus judeus, também a queda do muro de Berlim deu novo fôlego à paz e união mundial. Histórias que se cruzam no tempo, no espaço, e na memória do Mundo, que jamais olvidará que por entre o negrume da história da humanidade, espreita a compaixão vigilante daqueles a quem o infortúnio alheio serve um propósito maior do que a egoísta existência.

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