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Estados Unidos… ou Estados Divididos?

Cerca de mês e meio depois das eleições nos Estados Unidos da América, ainda estamos todos a preparar-nos para o que aí vem. Continua difícil acostumar-se com o facto de que, em 20 de Janeiro de 2017, Donald Trump será empossado presidente da maior economia do mundo. Depois de uma campanha longa e brutal e de um 8 de Novembro surpreendente, em que a eleição do empresário nova-iorquino calou sondagens e órgãos de comunicação social, todos procuram perceber como isso aconteceu e por que caminhos o país poderá seguir. No entanto, o que se observa é uma nação dividida como não se viu na história recente.

Não me estenderei sobre a figura de Trump. As falhas de carácter dele já foram abordadas à exaustão desde que ele decidiu se candidatar, lá em Junho de 2015. O que nos interessa são as feridas na sociedade norte-americana, abertas pela campanha. Tensões sociais e raciais exacerbadas, polarização política expressa em posições extremadas e percepções divergentes sobre os problemas do país e a forma de resolvê-los compõem um prognóstico desafiador para os rumos da nação nos próximos quatro (ou oito?) anos. Resumindo em uma frase: é possível dizer que o povo norte-americano tornou-se inimigo de si próprio.

A verdade simples é que, após a confirmação oficial da votação do Colégio Eleitoral, Trump obteve 304 votos contra 227 de Hillary Clinton, apesar de ela ter vencido no voto popular por larga margem, cerca de 3 milhões de votos. Essa foi a segunda vez que isso ocorreu em 16 anos, após a derrota de Al Gore em 2000. Por causa disso, liberais e conservadores entraram num debate sobre o verdadeiro propósito desse sistema, considerado demasiado arcaico para a realidade actual por parte da opinião pública, e do porquê de os Founding Fathers terem criado um método de eleição que seria tão falho e pouco representativo. Contudo, isso é só uma parte dessa caixa de Pandora que é a sociedade americana.

As profundas divisões partidárias e ideológicas da população americana, que já eram debatidas durante o governo Obama, ficaram escancaradas durante o ano e meio de campanha. No espectro político, mínimo é o esforço por um diálogo moderado entre liberais e conservadores. Em vez disso, prevalecem as visões pré-concebidas de um lado sobre o outro e a mentalidade do “nós contra eles”. Além disso, a presença maciça das redes sociais e dos filtros de informação fez com que as pessoas se cercassem apenas de quem concordasse com suas ideologias, diminuindo as possibilidades de um debate construtivo.

A maior das linhas que dividem o país é a de percepção, sobretudo, a respeito de quem pensa diferente. Parcelas de liberais e apoiantes do Partido Democrático idealizam os conservadores como atrasados e não conseguem perceber como apoiam alguém que enxergam como símbolo da violência social contra minorias, mulheres e pessoas de outras etnias. Para parcelas daqueles mais alinhados com a ideologia republicana, os liberais não passam de socialistas mimados a quem o Estado lhes deve protecção e benefícios. Note-se que é uma visão bastante simplificada das percepções de um lado sobre o outro, mas foi com base em percepções e não em factos que o último ano e meio foi vivido pela população americana.

Esses dois campos são representativos de dois contextos sociais bastante distintos. Apesar de haver as excepções em ambos os campos, é possível descrevê-los de maneira geral. De um lado, a América progressista, formada, sobretudo, pelos jovens adultos com formação superior, que vivem nas grandes metrópoles e têm profissões que mexem com informação e conhecimento. Além disso, não dão grande importância à religião. Do outro lado, a América tradicional, geralmente composta pelos moradores do campo e de cidades mais pequenas, com menor educação formal, e fortemente ligados aos valores da religião cristã e/ou evangélica. Essas duas Américas estão a se entender cada vez menos.

Nos últimos dez anos, ficou mais consolidada a diferença ideológica entre políticos Democratas e Republicanos. Por conseguinte, a identidade partidária dos apoiantes de ambos os partidos também se consolidou e ampliou a distância de ideais entre os dois campos. Assim, a margem de manobra para entendimentos políticos entre os dois partidos ficou bastante reduzida, algo já demonstrado pelas inúmeras vezes em que republicanos alimentavam os impasses e desacordos entre as casas do Congresso, bem como entre o corpo legislativo e a presidência. Isso é o espelho do crescente distanciamento ideológico no seio da população americana. No novo mandato, avizinham-se mais dificuldades, devido à pressão dos eleitores democratas, que exigem que os seus representantes façam forte oposição às políticas do presidente Trump.

No entanto, esse vai e vem de forças partidárias e posições extremadas não contribui para um entendimento mais alargado. Democratas e republicanos controlam à vez os órgãos legislativos, implementando ou revertendo políticas públicas em consonância com suas respectivas ideologias, e enfrentam oposição ferrenha do outro lado ao longo do caminho. Um exemplo recente disso foram os protestos que legisladores democratas realizaram em plena Câmara dos Representantes. Revoltados contra a inércia do Congresso, exigiam a votação de projectos de controlo do porte de armas. A iniciativa é válida, mas demonstra que, em vez de adoptarem posturas moderadas e de entendimento, os políticos americanos recorrem cada vez mais ao radicalismo.

A comunicação social também tem muito a reflectir nos anos vindouros. Os meses de campanha forneceram provas sólidas de que os media impressos e, acima de tudo, os televisivos, perderam o crédito que tinham junto ao povo americano. Lógico, as declarações e atitudes de Trump durante a campanha não foram dignas de um chefe de estado em potencial, mas as vias mediático em prol de Hillary Clinton esteve explícito. Isso teve o efeito de reforçar as crenças dos eleitores republicanos, que não hesitaram em desconsiderar a falta de qualificação de Trump para o cargo, pois acreditam piamente que ele “fará a América grande outra vez”.

A questão que se impõe aqui é a seguinte: como unir uma América tão dividida, especialmente no mandato de um presidente tão controverso? Diante das fissuras aqui expostas (e olha que nem sequer toquei em questões raciais, étnicas ou etárias, que por si só dariam outro artigo), a conclusão é de que quatro anos (ou oito?) não serão suficientes para sarar todas essas feridas. No entanto, é preciso que a população trabalhe por superar as visões unilaterais, tanto progressistas quanto conservadoras, sobre o futuro do país e comece a adoptar uma postura de diplomacia.

É muito fácil rotular e condenar quem discorda, mas os cidadãos precisarão de uma boa dose de abertura para se compreenderem uns aos outros e perceber os valores e qualidades daqueles que pensam de forma diferente. Um pouco de desapego às crenças e abertura para ouvir e entender outras ideias é um passo gigante para uma maior colaboração. Esse é o maior desafio que os Estados Unidos da América têm de enfrentar se quiserem ser grandes outra vez.

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