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Acesso ao Ensino Superior: onde ficam as pessoas?

É com base em notas que somos aceites ou rejeitados pelas universidades. É por uma questão de décimas que perdemos potenciais médicos vocacionados para o trato com pessoas. É com os rankings das melhores universidades e o volume dos futuros salários na mira que olhamos para as listas das vagas de acesso ao Ensino Superior.

Os números. Sempre os números. Ou seja, informação anónima que serve para simplificar o processo. Ou, como lembra o jornalista Rui Ramos num artigo de opinião, que serve para encaminhar os estudantes para cursos que não teriam procura e diminuir a “concorrência em certas profissões”. Independentemente das razões, o que nos resta é a burocracia alicerçada em algarismos.

Este sistema tem vários problemas, de entre os quais a inflação de notas é um dos mais discutidos. O relatório do “Estado da Educação 2014” aponta para isto mesmo: há certas zonas em que as escolas aumentam deliberadamente a nota interna dos alunos e os resultados dos exames acabam por não comprometer totalmente o acesso ao curso e estabelecimento escolhido. E assim vamos andando.

Por outro lado, com o programa Novas Oportunidades, houve quem tivesse conseguido passar do 7.º para o 9.º ano em seis meses. Um ano e meio depois, o 12.º estava completo. Para se aceder ao Ensino Superior, bastava fazer o exame da disciplina ou disciplinas específicas do curso a que o aluno se candidatava. E pronto, sem a média interna a contar para a média de acesso, muitos foram aqueles que conseguiram colocação nas instituições públicas superiores. Não estiveram sujeitos a todos os testes intermédios e exames nacionais e acabaram por ocupar vagas perdidas pelos alunos do ensino regular. Porquê? Por causa dos números.

O problema não está nesta descriminação positiva. O conflito, como sempre, está na seriação. Estes alunos, que completaram o programa Novas Oportunidades, tinham dificuldades no ensino regular. Muitos não conseguiam atingir a nota mínima para passar a determinada disciplina. Tiveram que procurar uma solução e acabaram, muitos deles, a completar o curso que queriam. São hoje profissionais na área desejada. São por isso, também, mais uma prova de que os critérios de acesso ao Ensino Superior descuram por completo a vocação.

É por conseguirem atingir médias elevadas que muitos jovens escolhem estudar engenharia ou saúde, mas, se a área é saúde, temos que estar a falar em Medicina. Enfermagem e afins são saídas secundárias. E não se esqueçam que, neste país de doutores e engenheiros, o importante é um papel a dizer que fizemos qualquer coisa, mas no curso certo. Ou seja, em Engenharia. Em Medicina. Em Direito. Mas isto está certo para quem?

Para uma família ávida de orgulho? Para um país atolado em médicos? Em 2014, Portugal era já o quinto país da União Europeia com mais médicos por cada 100 mil habitantes. Por essa altura, o curso apresentava ainda elevadas taxas de empregabilidade. Este ano, 158 jovens ficaram sem vaga para a especialidade.

Quer isto dizer que os tempos não são estanques, que o mercado é volátil e o que hoje nos pede pode ser rejeitado amanhã. Por isso, não nos podemos fiar nas percentagens da rejeição e da procura. Quando entramos na universidade, são os números que contam. Contudo, ao sair, pedem-se pessoas. Pedem-se capacidades de relacionamento e pragmatismo. Pede-se sentido crítico. Por isso, temos que nos fiar em nós, no valor acrescentado que somos capazes de gerar. Porque queremos gerar e não porque nos dizem que é assim que deve ser. Temos que nos fiar nas pessoas. E em todo o complexo que tal significa.

As universidades não podem ser um pré-estágio, mas podem ser uma área de desenvolvimento pessoal e formativo. Enquanto nós deveríamos escolher as instituições pelos profissionais dessas casas, as instituições deveriam escolher-nos pelo nosso perfil.

Facilmente se percebe que as entrevistas de selecção implicariam esforços extra de técnicas e recursos humanos, mas constituiriam também um caminho mais fácil para ajudar à harmonia do país.

Estabelecendo-se uma ligação clara entre o Ensino Secundário e o Superior, poder-se-iam realizar workshops nas várias áreas de formação. Algo parecido com os actuais ateliers de desporto, mas que abarcaria abordagens à fotografia, à culinária, à escrita de imprensa, a algumas leis fundamentais, exercícios de tradução. Enfim, áreas que fizessem de nós mais do que números.

E aí sim, poderíamos voltar a falar em números: porque pessoas mais bem-dispostas são pessoas mais produtivas. E nós precisamos de não só aumentar os valores de produção do país, mas sobretudo de potenciar o valor acrescentado de cada produto.

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