+1 202 555 0180

Have a question, comment, or concern? Our dedicated team of experts is ready to hear and assist you. Reach us through our social media, phone, or live chat.

25 em 40 anos

No ano em que a Revolução dos Cravos faz 40 anos,  eu celebro 25. Nasci durante o BOOM da economia portuguesa. Ouvi falar da fome que os meus avós passaram, em que “uma sardinha dava para dois”, das histórias dos meus tios na Guerra em África, perpetuadas até hoje nos álbuns de família, e na impossibilidade que a minha mãe teve em continuar os estudos, levando-a a mais tarde a emigrar, como sendo contos de um passado longínquo, um passado que jamais se repetiria. Enganei-me. Quatro décadas depois, a História exige de mim e de toda a minha geração uma atitude. A mudança de rota depende de nós. Mais do que nunca. É necessário ir buscar inspiração às nossas origens.

Na escola, foi-me transmitido que o 25 de Abril se tratou de um marco importantíssimo da História de Portugal. Confesso que o Mário Soares é o primeiro Presidente da República que conheci. Recordo-me dele, aquela figura gorducha, nas últimas páginas dos meus livros de História. Não era por acaso. Foi pelas mãos dele que entrámos na Comunidade Europeia, decorria o ano de 1986. Um feito para a época, depois de tantos anos enclausurados…Com o dinheiro que chegava da Europa, construímos estradas, pontes, bibliotecas, hospitais, tribunais. Passámos a ser olhados pelo mundo como sendo um país desenvolvido. Foi nesse país que eu cresci. Um país aparentemente rico, que me orgulhava. Onde de um momento para outro toda a gente tinha TV em casa, máquina de lavar e até telefone (lembro-me perfeitamente desta transição: tirando a televisão que sempre conheci, cheguei a lavar a roupa no rego com a minha mãe e de o telefone só existir nas lojas da aldeia). Muitos emigrantes regressaram. Passámos a ser um país de imigrantes. Olhava para os brasileiros e os ucranianos que chegavam, com pena. Pensava como éramos desenvolvidos e eles não. Sentia-me com sorte. Sorte por ter nascido no momento certo. Fiz o que me competia. Segui a bandeira do momento- estudei.

Em Setembro de 2008, tinha 19 anos. Era caloira. Foi a primeira vez que ouvi falar de crise, curiosamente, durante as praxes. Os alunos que se estavam quase a formar mostravam-se preocupados. Não me preocupei muito, confesso. Afinal dali a três anos estaria tudo resolvido. Não tive consciência da bomba que estava para arrebentar nas nossas mãos. Já Durão Barroso tinha avisado, em 2002, que “os senhores (do PS) deixaram Portugal de tanga”. O país riu-se e realizou o Euro 2004. Afinal quem imaginava que poderíamos regredir? Impossível. Éramos um país admirado, em desenvolvimento. Ilusão. Caiu a realidade. Vivíamos acima das possibilidades.

Hoje, sou formada. Tenho uma licenciatura em Ciências da Comunicação. Desde 2011 que me debato com o mercado de trabalho. Sei bem como é um mundo implacável. Já não sou a ingénua que era. Dei de caras com uma realidade que me envergonha e não falo da crise económica, falo da crise de valores. Essa é de facto a nossa maior crise. Há ausência de valores fundamentais, como são a verdade, a igualdade e a democracia. Amante do jornalismo como sou, horroriza-me a realidade do sector, que se deixa intimidar pelos políticos e/ou agentes económicos. Em menos de três anos,  já senti na pele o lápis azul. Não foi por um país assim que Salgueiro Maia e os seus companheiros arriscaram a vida. Não é este o país que eu idealizava. Pouco me interessa um país que ultrapassa os seus problemas económico-financeiros, se continua a ser um país proliferado por meia dúzia de sujeitos que dominam tudo ao seu belo prazer. Ambiciono sim, tal como os capitães de Abril, um Portugal justo. Assente na transparência. É certo que ao longo das últimas quatro décadas se desenvolveu muita coisa, mas o mais importante foi desprezado – o sentimento de colectividade. As crises económicas vão e voltam. O que realmente faz toda a diferença são os valores, são eles que nos conduzem. Que a minha ingenuidade de há uns anos, seja a realidade do país dos meus filhos. É isso que desejo. Como um dia destes ouvi – “que se lixe a crise, quero um país justo”.

Share this article
Shareable URL
Prev Post

De Good Wife a Mulher de Armas

Next Post

A Persistência na Memória

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.

Read next

Parabéns!

Nós que somos pais temos sempre a expectativa de que os nossos filhos sejam o melhor reflexo de nós. E que de…

Robert Mulligan

A entrada do Canal Hollywood iluminou a casa por volta dos 14/15 anos, quando o meu pai mandou instalar a…